Cartas de Junho (16)

Foto cedida por Magno Herrera Fotografias


“EU PREFERIA SER COMO VOCÊ SONHOU PAI

Quem poderia imaginar que eu estava ouvindo tudo? Numa mesa de operação, minha consciência me fazia temer. Foi um acidente tão violento. Moto, sem capacete. Eu me arrebentei toda. Estava tão nervosa que saí desembestada. Eu queria que eles, também sofressem, mas não pensei que fosse atrair, com minha imprudência, tanta dor.

Eu soube que não era para ter sido do jeito que foi. Eu antecipei meu retorno em quinze anos. Imagina o que eu poderia ter feito em quinze anos... Se em um ano, a gente vive tanto né?

A verdade é que eu precisava ser operada, eles imaginaram que eu não podia ouvir, eu não podia juntar as palavras que ouvia e racionar, mas eu podia. Eu estava viva e estava aflita pelo desfecho. Na real, ninguém quer morrer, nunca. Faz parte do instinto de preservação. É da Lei! Ninguém quer e eu não queria morrer.

Eles tiveram que me operar e eu ouvia tudo, eu ouvi quando falaram da doação de sangue. Eu entrei em desespero em cada situação adversa, ali imóvel, de olhos fechados, eu pedia para viver. Eu sofri com a falta de sangue, eu sofri com a mamãe segurando minha mão, chorando. Eu sofri quando me pediram perdão, eles se sentiram culpados, mas eu fiz tudo errado. Eu sofri e queria me mexer e falar para ela que eu precisava de sangue e precisava operar logo. Eu sentia a dor do meu corpo, meu corpo desfalecendo. É estranho falar isso agora porque eles não acreditam em nada. Eu também não acreditava em nada e me espantei com tantas sensações quando eu me agarrava à vida. Quando eu me agarrava ao corpo que estava entrando em falência. Eu, em desespero, lutando para viver e era à toa, era bobagem porque eu queria viver, mas não merecia viver porque eu provoquei a ruína do meu corpo físico e deveria sofrer com as consequências do que ocasionei.

Eles doaram e eu fiquei feliz porque me senti amada. NO FIM, EU PERCEBI QUE AS PESSOAS PODEM SER MUITO GENEROSAS E DEMONSTRAM SEUS NOBRES SENTIMENTOS ATRAVÉS DA DOR. Tem quem se faz de forte e chora escondido. Eu vi meu pai sofrendo tanto. Desculpe! Eu me arrependo.
Deus não castiga ninguém pai.
Deus é tão bom que dá outra oportunidade. Eu queria tanto que você acreditasse. Que soubesse que eu só não estou melhor porque você sofre. Eu amo você pai e não te afrontei falando da minha opção sexual, eu sou assim. Queria te agradar, mas não deu. Por favor, pai se conscientiza que a vida é maravilhosa e eu te amo muito. Se conscientiza pai, você precisa tomar seus remédios direito porque isso, também é suicídio. Eu sinto muito. Eu que peço perdão para vocês, para todos. Se eu soubesse que passaria por tudo isso, nunca teria falado. Eu preferia ser como você sonhou pai. A ver você desse jeito, eu vejo, eu sinto pai. Para que eu melhore, você precisa se esforçar pai. Por favor.
SILVINHA
03/06/18


----------------------Paula Alves--------------------

“EU NEM ERA OBSESSOR, SÓ FUI COMPANHEIRO DE COPO MESMO”

Eu já estava jogado há tanto tempo. Nem pensei que tinha um lugar apropriado pra gente. Morri, vi meu velório e fui embora dali. Fui vagar porque não achei que tivesse outra alternativa.

Senti fome, frio, sede, dor. Eu tive vontade de gritar e gritei. Eu quis morrer de verdade para não sentir mais nada, nem angústia, nem dor. O vício gritava em mim. Uma vontade insuportável de beber até cair. Pensei na cachaça e quando dei por mim estava no bar do Mané. Quanta saudade! Estavam ali meus companheiros, tudo gente boa, bebendo. Até lembraram de mim. Achei um pouco estranho porque eles se lembravam de tudo o que eu me lembrava. Parecia até que eu estava induzindo o pensamento deles.

Cheguei perto, respirei fundo e sem querer, foi como se tomasse um trago. Que bom! Eu fiquei abismado e quis mais. Naquela noite, eu bebi muito, muito e fui para casa com o Mané. Eu encostei nele porque mal conseguia me erguer. O Mané era o dono do bar e não bebia, coitado. Começou a sentir vontade de beber e bebeu mesmo. Eu sei lá por que foi que eu fiz aquilo doutor. Eu só queria sentir o álcool de novo. Não fiz por mal. O pior é que o Mané ficou viciado. O sujeito bebeu tanto que começou a fazer bobagem no bar. O dono do bar não pode beber e ele bebia com os caras e não cobrava mais.

A mulher dele ficou irada, eu vi tudo porque fui morar com o Mané. Até fiquei nervoso de ver o jeito que ela tratava o marido. Onde já se viu mulher enfrentando o marido? Eu não sei se fiquei muito indignado naquele dia porque ele ofendeu a mulher e levou um sopapo. Foi um quebra pau danado. Agora, depois que o Mané perdeu tudo, perdeu a mulher e o bar, ficou viciado, demorou, mas eu vim pra cá. E agora, fiquei sabendo que eu sou responsável, mas como assim doutor? Eu, responsável pela queda do Mané? Não pode não. Eu sou responsável só pela minha queda. Cada um com a sua canalhagem. Eu não posso ser responsável pelo vício do Mané. Já fiquei sabendo que eu vou ter que ajudar porque, desta vez, ele está arruinado. Vão trazer o Mané de volta doutor. Pode?

Ele vai voltar mais cedo por causa de tudo isso. Já ficaram sabendo do que vai acontecer porque, se ele não mudar, não tem jeito não. E aí é que vai complicar pro meu lado porque eu vou ter que receber o Mané de filho. Pra ver se eu tiro o vício dele, mas e o meu? É muita carga doutor. Eu não sei se consigo me livrar do meu fardo e vou ter que tirar o fardo dele? Não tô vendo justiça nisso não. Eu nem era obsessor, só fui companheiro de copo mesmo.
RICARDO
03/06/18


------------------Paula Alves--------------------

“DEMOROU MUITO PRA ENTENDER QUE O QUE IMPORTA NÃO É O QUE SE TEM, MAS O QUE A GENTE FAZ COM O QUE TEM”

Eu não tenho como te dizer que não aprovo o que fiz porque seria mentira. Ainda hoje acredito que nós temos que aproveitar as oportunidades. Seria muito tola se deixasse passar a chance. Eu sempre fui linda. Naquela existência podia ser pobre, mas fui bela demais. Queria ser rainha. Mais do que qualquer coisa. É feio querer sair da pobreza, parar de esmolar?

A ambição agora é maldade? Eu só joguei com a sedução, mais nada. Casei e virei rainha sim. Com muito orgulho, deixei tudo para trás. Honrei o rei, honrei a realeza e desencarnei num sofrimento terrível. Por quê? Cheguei deste lado, me informaram que eu trapaceei. Me informaram que não era meu plano e eu tirei o lugar de outra pessoa.

Como assim? E o livre arbítrio?
Tudo bem. Não teve diálogo.

Eu tive que reencarnar e sabia que teria de enfrentar a pobreza. Mesmo não sendo tão bela, era astuta. Vi o homem com quem deveria contrair matrimônio, mas eu não o desejava porque era pobre. Eu me vi envolvida com um rapaz rico e muito charmoso. Novamente consegui me casar e fui rica, feliz, enquanto encarnada. Tive tudo o que quis e não me arrependi. Pensava no rapaz pobre, mas foram, apenas pequenas lembranças.

Desencarnei e novamente sofri a terrível cobrança da consciência. Era como se o rapaz pobre me cobrasse e junto com ele, muitos Espíritos dizendo que deveríamos estar ligados. Eu não entendia. Cheguei você lembra? Tão agoniada, revoltada e sem direito de escolha, renasci. Agora eu tinha necessidades especiais, para ver se, desta vez, eu persistiria no plano.

Eu atrasei em setecentos anos um plano onde muitos estavam envolvidos. Novamente reencarnados, eu me vi na pobreza. Em uma pequena cidade, conheci um rapaz de nome Jeremias. Eu me senti atraída por ele. Jeremias me tratava com a maior delicadeza e me desposou, mesmo sabendo de minha dificuldade para andar. Ele foi tão bom e paciente que conseguiu me fazer andar com bengala. Nos mudamos e, na cidade grande, arrumamos emprego numa casa de gente muita rica. Eu me vi envolvida pelo patrão e pensei que pudesse ter um relacionamento com ele e mudar de vida. Ser rica, ter facilidades, mas me lembrei do Mestre. Me lembrei de tantos ensinamentos e, desta vez, tive vergonha dos meus pensamentos.

Eu me agitava, pedi para ir embora e Jeremias disse que o trabalho era muito bom. Nós ficamos e eu me controlei, nunca me envolvi com o patrão. Orando, vigiando os pensamentos, consegui esquecer. Ainda mais quando começamos a ter nossos filhos. Minha irmã Odete morreu e eu precisei criar os três dela. No fim estava com sete crianças. Percebemos uma necessidade de fazer alguma coisa pelas crianças do local onde vivíamos, abrimos uma creche e fomos vivendo. Foi tudo com muito trabalho, mas foi ótimo viver assim, com trabalho, sem luxo, dentro do plano de Deus.

Hoje estou aqui com a cabeça no lugar, agradecida e em paz porque deu tudo certo. Demorou muito pra entender que o que importa não é o que se tem, mas o que a gente faz com o que tem. Muito obrigada por sua ajuda.
AGUINELA
03/06/18


--------------------Paula Alves---------------

“DE TEMPOS EM TEMPOS A GENTE SE ENCONTRA DIZENDO QUE VAI REPARAR E REVIDA”

Eu fiz tudo por aquela mulher. Eu a amei. Trabalhei tanto para fazer todos os gostos da danada. Casei, de papel passado e na igreja. Eu não tinha receio de entregar todo o dinheiro na mão da desalmada. Comprei casa e coloquei no nome dela porque pensei que, se eu morresse, ela estaria na casinha dela. Ela só me enrolando, nunca quis ter filho. Pra não estragar o corpo, a ruim.

Eu doido para ver a cara do bacurizinho. Nem pensar que ela ia estragar a barriga. Nunca entendi por que tinha que visitar a mãe todo dia. Passava na rua e o povo debochando, dizendo palavra doutor que eu não vou nem repetir porque não pode. Eu ainda sofro com isso. Não é questão de orgulho não. É questão de brio. Homem tem que ter dignidade doutor. Aí cheguei mais cedo em casa. Eu ouvi uns barulhos que fiquei desconfiado, mas era o meu primo doutor. O malacabado do meu primo que tava em casa com ela. Passaram uma conversa e eu caí. Fui ver no outro dia a mulher com marca, toda estranha. Falei para ela tomar cuidado comigo, eu avisei. Fiquei na espreita e segui a marginal. Claro que ela tava me traindo. Peguei no ato. Quis morrer. Ninguém quer ser traído. Ouvi aqui que isso não é nada. De tempos em tempos a gente se encontra dizendo que vai reparar e revida.

Eu nunca que ia fazer mal pra ela. Nunca. Eles devem estar enganados. Eu queria família doutor, só isso. Falei que matava. Eu precisava limpar meu nome. Pensei em pegar o cabra, mas quem me devia respeito era ela. Vou falar mal de quem apedreja?

O senhor fala assim porque não esteve na minha pele, perdão... Eu tentei afogar a mardita, mas não consegui. Eu olhei pra ela e senti amor. O senhor acredita nisso? Era para eu ser um homem. Que vergonha. Olhei para ela e senti amor. Me falaram aqui que isso já é o perdão em mim. Eu não quis saber de perdão, nem de amor. Eu tinha é que ter amor próprio, isso sim. Arrumei minhas coisas e fui embora. Nunca fiquei sabendo dela e nem quis mais outra nenhuma. Quando morri, de uma verminose desgraçada, saí do corpo e voltei direto pra junto dela. Como sofri. Eu não quero mais saber dessa mulher. Eu não quero. Parece que ela só me faz mal.

Eu se pudesse tirava essa mulher da minha cabeça. Já estava tão satisfeito de ter vindo pra cá. Para não ver mais o que ela faz da vida. Agora nem depois de velha a mulher tem vergonha na cara. Já fui informado que as coisas vão mudar. Vamos nos encontrar na próxima como irmãos. Irmãos para ver se temos cumplicidade. Eu não sei de nada. Eu nem entendo estas coisas direito. Voltar, virar homem e ser meu irmão. Cada coisa. Eu não tenho escolha mesmo.
VITÓRIO
03/06/18

---------------------------------Paula Alves----------------------------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias



“NÃO IMPORTA O TEMPO QUE AS PESSOAS TÊM AO NOSSO LADO, MAS A IMPORTÂNCIA QUE DAMOS A ESTA OPORTUNIDADE”

Tudo o que um pai quer para a sua filha é a felicidade. Eu sonhei em ter uma família e encontrei uma bela esposa. Uma esposa honrada e afetuosa. Quando eu soube que ela estava grávida foi o meu maior contentamento. Pensei que Deus me amava muito e esperei os meses passarem para abraçar o meu bebê. Nasceu Emanuely e tive a desagradável surpresa de saber que minha esposa tinha morrido no parto. Foi como se Deus tivesse trocado uma vida por outra. Eu mesmo não poderia escolher. Não poderia dizer quem era mais importante para mim porque eu já amava aquela criança.

Tive a maior dor e a maior alegria no mesmo momento. Senti que tinha que me doar por completo àquela criança que não tinha mãe. Sabia que Deus iria nos amparar e eu estreitei os laços com ela. Éramos só nós dois e eu a amava, tentava fazer jus a mãe dela que foi uma grande mulher em minha vida. Não importa o tempo que as pessoas têm ao nosso lado, mas a importância que damos a esta oportunidade. O tempo não diz nada. Nós vivemos um grande amor e isso é o que importa. Criei minha filha com princípios e tentei ensinar a ser uma mulher digna como a mãe dela, mas parece que tudo se perdeu. Conheceu um rapaz e jogou tudo fora por ele. Desprezou tudo o que ensinei. Rapaz que não trabalha, só quer saber de coisas ilícitas. Mesmo assim, ela não ouviu, entrou naquele carro e saiu por aí. Carro com música gritante, cheiro de cigarro, com muitos homens. O que ele poderia proporcionar para ela? Como ela poderia se envolver com um sujeito destes? A menina que eu tanto amei...

As coisas ainda pioraram porque ele fez a cabeça dela e ela foi embora. Preferiu ficar com ele, saiu de nossa casa e se juntou com aquele marginal.
Eu morri foi de desgosto. Não consegui encaminhar bem minha menina. Demorei para chegar aqui. Vaguei, sofri e fui socorrido por Lindalva. Minha esposa querida que tenta me conscientizar de que as pessoas boas devem ser espelho para aquelas que ainda não são tão boas assim. É o joio e o trigo.
Eu tive a permissão de ver Emanuely e me atormentei doutor. Não sei como posso continuar sabendo da situação da menina. Ainda estava com aquele sujeito. Nem de longe se parece com minha filha. Está tão envelhecida, desajeitada. Com quatro crianças que nem tem o que comer dentro de casa. O malandro perdido nas drogas ainda quer agredir a filha que tanto amei. Isso é vida? Me explica, por que é que ela se entrega a uma vida miserável dessas?

Eu não consigo entender. Tô sem saber como ela pode sair dessa vida de humilhação.
AGUINALDO SILVA
10/06/18

----------------------Paula Alves----------------

“ORAÇÃO É O QUE TODO MUNDO PRECISA”

Eu fui marido, pai e avô. Trabalhei a vida toda para deixar a minha família em paz. Serviço de gente pobre, mas honesta. Estranho como as pessoas se esquecem da gente. Eu não me esqueço de nenhum deles. Ainda consigo me lembrar de fatos importantes da nossa história. Eu sei que aqui os fatos ganham vida. É como se as lembranças todas tivessem alma. Eu lembro de tudo e sinto saudades. Eu estou sumindo da memória deles e eu não queria desaparecer.

Eu queria que eles soubessem o quanto eu me esforcei, eu queria que eles soubessem que alguns dias foram ruins. Eu não quero que eles fiquem me endeusando, não é isso não, mas um nada?

Não fazem nenhuma oração, nem um pensamento chega até mim. Houve um tempo que eu conseguia segurá-los nas palmas das mãos, tão frágeis, tão meus. Eles se alegravam quando eu chegava do trabalho e ninguém se importava com o cansaço porque queriam brincar e eu brincava com eles. Eu ouvia, eu sempre ouvi, mas quando a velhice chegou, eu fiquei sozinho. Vim para cá precisando de apoio. Ninguém quer morrer. Ninguém quer sair da casa que construiu e deixar os parentes. Eu quis atenção, mas eles precisavam estudar e tinham que comprar as coisas. Eu sei que o tempo é curto, mas dá pra fazer tantas coisas, passear e ficar jogando conversa fora. Sei lá. Eu não fui importante pra eles, deve ser isso.

Fiquei velho e cheguei aqui me lastimando. Se eu tenho esta oportunidade para falar, vou dizer que eles devem orar mais. Orar por eles, orar por nós. Orar por todos que é só com oração mesmo que a gente se liga ao Alto, que a gente coloca a cabeça no lugar e consegue ter um momento de clareza mental. Oração é o que todo mundo precisa. SEBASTIÃO
10/06/18

-------------------Paula Alves--------------

“EU RECEBI MUITO AMOR E ENTENDI QUE CADA UM TEM UM CAMINHO E DEVE SE ENTREGAR A ELE”

Vou falar o quê? Que eu morria de inveja? Não sei se foi isso. Eu lembro que éramos tão amigas. Desde pequenas. Escola, brincadeiras. Nós descobrimos o mundo juntas e quando ficamos mocinhas, meus pais morreram e eu percebi que a vida dela era muito mais fácil do que a minha.

Ela tinha sonhos que não eram para mim. Ela tinha possibilidades e eu não. Não achei justo tanta coisa, mas ia reclamar pra quem? A gente vive a vida sabendo que nem tudo é para todos e isso revolta. Era minha amiga e eu a amava, mas começou a me irritar. Quando ela conheceu o Gustavo me deu vontade de matar. Aquele sorrisinho, aquela ingenuidade, a alegria. Patético. Tanta gente sofrendo e ela querendo amar. Pensando em casamento, vestido, damas de honra, para mim indignação. Eu queria servir a causas nobres, fazer pelo mundo e não podia comprar nem um saco de batatas. Ela podia muito mais do que eu e se entregava ao amor para neutralizar todos os impulsos idealistas, quanto desperdício!


Eu não queria mais ficar perto dela, eu queria me afastar da bobagem do amor que cega e entorpece.

Me aliei a um grupo de pessoas que pretendiam fazer o bem e me deparei com vários jovens bobos que preferiam jogar as noites na bebedeira, não era isso que eu queria para mim. Minha vida não podia estar entregue a isso. Foi quando conheci o Mauro e percebi que tinha um propósito para nós. Começamos a trabalhar com moradores de rua. Nisso, muitas outras pessoas que desejavam fazer o bem se aliaram a nós e eu me senti bem, confortável como numa grande família onde todos têm as mesmas intenções. Nunca mais vi a Angélica, ela deve ter casado e sido feliz com o Gustavo. Eu sei que, quando as pessoas estão dispostas a fazer pelo coletivo, Deus fornece os meios e permite que outras tantas pessoas nos encontrem e deem mais força para que tudo se encaminhe. Eu fui muito feliz. Não casei, não tive filhos, mas ajudei tanto e fui ajudada por isso. Eu recebi muito amor e entendi que cada um tem um caminho e deve se entregar a ele.
LUCRÉCIA
10/06/18



“ESPERO QUE TODOS POSSAM SER TOCADOS PELO AMOR”

O que seria de nós sem os corações apaixonados?
O que seria de nós sem os envolvimentos amorosos?

Pensei que o amor fosse besteira e pensei que nunca fosse sentir amor por ninguém. Não pensei que houvesse um sentimento capaz de nos mover. Um sentimento que fizesse mudar os pensamentos, mudar os objetivos, eu não pensei. Fui uma mulher estudada e tive bons empregos. Não pensava em casar porque tinha tudo o que desejava, meu trabalho e meus amigos. Minha vida estabilizada.

Eu cresci vendo meus pais brigando e era tudo tão agitado e angustiante que não queria isso pra mim. Até o dia em que fui para um congresso e conheci Leonardo. No início, simpatizei com ele que foi gentil comigo. Conversamos e fizemos amizade, só. Dois dias depois, eu me lembrava dele com saudades. Achei estranho e liguei. Aquela ligação mexeu comigo porque queria vê-lo. Queria conversar com ele. Estranhei. Era como se o mundo estivesse conspirando para isso. Fiquei pasma quando ele, discretamente, me falou que estava noivo e eu senti doer no peito. Dor acredita?

Eu nem conhecia aquele homem e senti que poderia perdê-lo. Era confuso para mim, eu que tinha tudo no lugar. Eu tinha tudo planejado e me deparei com uma confusa mental e pior, uma confusão nos meus sentimentos. Eu chorei. Não quis ser sozinha. Eu olhei minha casa, não tinha nada fora do lugar, não tinha barulho, era só eu.

Estava tudo errado porque a vida não pode ser só isso. Eu liguei de novo e fui sincera com ele, falei o que eu estava sentindo e eu desejei que ele sentisse a mesma coisa. Eu não queria ser leviana, mas entenda, eu o amava. Como poderia amá-lo?

Eu o amava de verdade. Ele não largou a noiva e eu fiquei sofrendo por três anos. Depois disso, num outro congresso, encontrei o Maurício e iniciamos um relacionamento que durou a vida toda. Toda minha vida com um homem que me amou e ensinou coisas pelas quais sou grata. Percebi que Deus coloca pessoas no nosso caminho para nos desbloquear. É tão importante estarmos em contato uns com os outros porque nós afetamos as pessoas e elas nos afetam. Ás vezes, afetamos no bem, outras no mal, mas de qualquer jeito é sempre para mexer com os sentidos. Eu estava inerte, eu não sentia nada e o Leonardo me desbloqueou.

Eu senti amor, perda, dor, frustração, tristeza e abandono. Eu senti a necessidade de ter alguém e ser amada. Eu percebi tanta coisa por causa dele e me deixei amar pelo Maurício. Quando ele apareceu, eu não quis perder a chance de me envolver. De viver um grande amor. E eu vivi. Foi tão bom para mim. Espero que todos possam ser tocados pelo amor. O amor que eleva e vivifica.
SORAIA LINS
12/06/18 

--------------------------------Paula Alves--------------------------


Foto cedida por Magno Herrera Fotografias

“TODOS NÓS PRECISAMOS NOS SENTIR PARTE INTEGRANTE DO TODO”

Foi um alívio quando percebi que éramos iguais. Todos ali com tantas limitações, todos com dificuldades. A ausência de palavras que nos separava do mundo, permitia nossa aproximação.

No início, achei tudo bem estranho. Em minha mente infantil, achei que fosse único (risos). Eu adorei vê-los. Todos tão especiais, todos tão diferentes, mas naquele momento nós fazíamos parte de um todo. Minha mãe hesitou, me teve por anos numa redoma. Ela tentou me proteger de tudo e de todos. Depois de tantos acontecimentos que evidenciaram o quanto as pessoas são preconceituosas e agressivas, ela achou melhor que fossemos apenas nós em nosso lar, mas o que ela não sabia era que mesmo em nossa casa, as pessoas me rejeitavam. Não era culpa deles, eu era feio e sem educação. Eu não soube me comportar e causava constrangimento aos irmãos mais velhos. Eu não queria, amava meus irmãos. Eu achava o Evandro lindo, lindo. Sempre quis ser como ele. Meus irmãos gostavam de mim, mas se sentiam envergonhados e, muitas vezes, não me queriam por perto, eu achava graça e isso me fazia ficar perto sempre, para o desespero deles. Até mesmo em casa, durante as refeições, eles se incomodavam e saiam de perto. Minha mãe não queria aceitar, mas foi o que aconteceu. Eu não culpo ninguém, só aos erros que cometi no pretérito.

Hoje sou agradecido porque isso tudo fez com que eu pudesse desenvolver virtudes que estavam adormecidas. Eu aprendi tanto. As pessoas podem imaginar que eu não compreendia, que eu não conjecturava, eu não sentia. Em parte estão certas porque no corpo físico eu tinha todas as limitações que a patologia neurológica me permitia ter, mas desprendendo da matéria, durante o sono, eu readquiria minhas funções de Espírito perfeito. Eu tinha conversas maravilhosas com meu instrutor que me explicava tudo o que ocorrera durante o dia, ele me incentivava e mostrava os prós e os contras da evolução adquirida com limitações físicas e mentais. Foi uma descoberta magnífica todos os anos em que estive encarnado.

Depois de anos sendo aconselhada pela amiga professora, minha mãe me levou para escola de especiais e eu encontrei meus afins. Como foi reconfortante. Todos nós precisamos nos sentir parte integrante do todo. Todos nós merecemos nos sentir desejados e queridos. Eu sou muito grato pelos professores que me ajudaram a aprender tantas coisas, com toda a paciência, com muito amor, sem ficar se prendendo na harmonia do rosto ou no jeito de expressar, eles doaram muito e eu os amei por isso. Aos meus amigos o meu mais profundo reconhecimento. Todos como eu, na obstinação de expiar um erro, de depurar ou de avançar mais rapidamente para cumprir um objetivo. Todos com juízo. Pena que poucos percebem. Com gratidão.
VITOR
17/06/18

-----------------------------Paula Alves-----------------------

“TODO MOMENTO, SOMOS BENEFICIADOS. MESMO QUANDO SOMOS TÃO INGRATOS”

Eita forró danado! Foi tanta festa, foi tanta cantoria que a vida foi só bem querer. Eu aproveitei demais o sertão. Não existe queixa, existe a lembrança boa demais de um tempo que se foi.  Eu não me arrependo porque eu aprendi com tudo. Eu acho que a gente tem que olhar para a vida com respeito, deve valorizar todos os momentos que a gente teve e agradecer a Deus é tão importante, muito mais do que ficar pedindo. A verdade é que o grupo de sanfona foi perdendo espaço, mas o amor pelo baião continua no meu peito. Eu aprendi demais no Brasil, tanto que hoje eu amo esta terra que também é minha. Vivi me lamentando depois que precisei sair do meu país e vir para cá. Não foi fácil deixar o piano da Europa e ficar exilado no Brasil. Como Espírito que arruinou a existência por escolhas erradas, eu me decepcionei com meus instrutores porque afirmaram que eu não poderia mais ficar naquele país que, para mim era o melhor do mundo, mas por que me deixei levar pela ganância? Eu sempre fui músico. Eu sempre desejei impactar as pessoas com minhas canções, mas naquela existência a vida era paupérrima.

Eu precisa deixar a música e trabalhar de outra forma, para isso, eu iria estimular outras virtudes. Era o que tinha que ser, mas o que foi que eu fiz?

Eu usei o piano para carregar armas. Eu infringi a lei, eu coloquei a vida de dezenas de pessoas em risco por causa da minha ganância. Desencarnei naquele dia, vaguei, sofri horrores e quando fui resgatado recebi a notícia que sairia de lá. Eu deveria reencarnar no Brasil. Claro que não vim com alegria, claro que me recusei. Claro que eu nem percebi quando já estava aqui. Vim contrariado, mas Deus é tão bom que me colocou numa família de violeiros. A música novamente na minha vida. Tinha a enxada na mão, calos durante toda a mocidade, mas também a sanfona. Que beleza foi conhecer a sanfona. Ave que felicidade saber que, a todo momento, somos beneficiados. Mesmo quando somos tão ingratos, ainda assim, o Pai nos beneficia. Graças a Deus.
ODORICO
17/06/18

---------------Paula Alves------------

“AQUELE ALGUÉM QUE PODERIA ME AJUDAR NÃO APARECEU E EU FUI EMBORA”

Era muita roupa para lavar. Comecei novinha. Treze anos assumi as roupas que a mãe lavava porque a pobre tava doente. Preferi trocar com ela, a mãe ficava em casa com os menores e eu lavava a roupa. Naquele dia, eu achei estranho meu primo lá em casa. Era um rapaz, tinha a namorada, ia casar. Ele nunca ia lá em casa e  nesse dia apareceu. Eu fui pro rio com aquele monte de roupa e ele saiu escondido atrás de mim, não tive muito tempo pra perceber o que ele queria. De repente, a saia levantou e foi um grito só. Desgraça! Eu não aguento nem lembrar. Preferia ter morrido naquele dia. Era melhor morrer do que ver o jeito que ele se ajeitou e ainda me falou pra não dizer pra ninguém.

Ainda hoje eu acho que não devia contar. Eu sei que tive permissão e, ainda assim, acho que é imoral e pecaminoso. Eu não queria ter que viver isso, mas não fui a única, não sou. Chorei, lavei a roupa. Não sabia se contava. Cheguei em casa e ele tava lá falando com a mãe. Eu fiquei com medo. Ele falou que ia levar o convite de casamento e foi todo bonzinho quando o pai chegou. O problema é que depois de quatro meses eu comecei a sentir mal. Eu estava péssima e a mãe percebeu. Ela já foi gritando e dizendo que eu tinha me deitado com alguém. Falou que eu tinha emprenhado. Eu fiquei sem saber o que fazer. Precisava falar e a mãe ouviu se segurando, doida pra me bater. Quando eu terminei, ela me chamou de mentirosa. Ela não acreditou em mim e me cobrava de dizer o nome do homem que tinha me desonrado. O que eu ia dizer?

Meu pai chegou, brigou, gritou, chorou e me pôs pra fora. Eu levei muito tempo pra entender que eles também não sabiam o que fazer. Fui pra casa da minha avó, mas ninguém me queria por perto porque numa cidade pequena onde todos se conhecem, eu era uma vergonha. Eu fui embora, passei fome e decidi mudar de vida pra criar meu filho. Eu tive que crescer. A vida nuca foi fácil pra mim. Pegar um ônibus, partir e crer que se é sozinha na vida. Compreender que, numa situação de desespero, muitas vezes a gente se agarra no invisível porque tudo o que você conhece não serve pra te salvar.

Nunca teve ninguém por mim. Aquele alguém que poderia me ajudar não apareceu e eu fui embora. Mudei de cidade com o dinheiro que a minha avó me deu. Trabalhei num restaurante porque a dona também teve uma vida difícil e se compadeceu da minha sina. Meu filho nasceu e eu tive que encarar tudo. Me fortaleci no amor daquele menino e, aos poucos, as coisas foram se ajeitando. Você me pergunta se eu já posso reencontrá-los e eu te respondo que não tem necessidade nenhuma de ter uma aproximação. Eu prefiro com o esquecimento. Sei dos planos. Sei que estaremos juntos de novo. Sei que, em outras vidas, eu errei, não é uma questão de perdoar, simplesmente não quero vê-los. Se eu tenho que me envolver, tudo bem, mas que seja na carne.
DORA
17/06/18

-------------------Paula Alves--------------

“MUITOS QUANDO OLHAM PARA O MÉDICO, PENSAM QUE FAZEMOS SEM NOS ENVOLVERMOS”

Era muita gente. Tantos feridos. Chegavam de todo jeito. Eu nem pensei que estudaria para passar por tudo aquilo. Amava a medicina, mas era um delírio aquele hospital. Não falo pelo dinheiro não, falo pela necessidade daquelas pessoas. Muitos quando olham para o médico, pensam que fazemos sem nos envolvermos. Muitos podem achar que é um ato mecânico, onde nós não olhamos nos olhos e não sentimos, mas não são todos assim.

Eu sonhei me tornar médico e tudo o que eu queria era promover a saúde, era curar, reestabelecer. Eu queria que tivessem conforto. Eu me dediquei todos os dias da minha vida. Eu também senti fome, frio, eu renunciei ao meu bem estar, às minhas necessidades ou lazeres para me doar completamente ao meu ofício.

Quando um paciente vai a óbito é como se você tivesse fracassado. Muitos diziam: “Você não é Deus.” Verdade! Mas, eu achava que Deus me colocava naquele lugar para realizar a Sua vontade e eu havia fracassado. Eu sempre achava que podia fazer melhor. Eu sempre quis que as crianças se curassem ou que as grávidas tivessem seus filhos normais.

Eu questionei tanto, eu sofri. Eu não fui apresentado a esta explicação que nos permite ter fé e prosseguir seguros de que tudo está no lugar certo. Eu achava que o erro era meu.

O tempo passa e o corpo mostra o cansaço. A juventude impulsiona e faz buscar ultrapassar as barreiras, mas a idade faz o esmorecimento chegar.

Chegou num momento que eu não queria mais trabalhar. Eu não queria mais ver sofrimento. Não queria ver os familiares chorando. Não quis mais ver sangue. Eu não quis. Eu olhava para eles e deixava esperando porque eu não sabia o que fazer. Parecia que nenhum remédio ia fazer melhorar. Eu não tinha nada para fazer.

Talvez, se tivessem me ensinado a pensar além da matéria, eu ia entender que o meu trabalho era só um dos recursos. EU TRATAVA O FÍSICO, MAS TEM MUITO MAIS DO QUE ISSO. NÓS NÃO SOMOS FEITOS SÓ DE CARNE. Eu não percebi.

Só entendi quando cheguei aqui. Fui tão bem recebido. Fui claramente esclarecido e hoje tenho certeza de que posso ser útil. Farei o que for preciso para que possa auxiliar. TENHO MUITO AMOR EM TRATAR DAS PESSOAS E SEI QUE, COM ESTE GRUPO AO QUAL ESTÃO ME INSERINDO, POSSO RETOMAR MEU PRAZER DE CURAR. Aqui tem muito trabalho que deve ser bem executado. Eu agradeço ao Senhor.
DANIEL
17/06/18


-------------------------------------Paula Alves--------------------------------


Foto cedida por Magno Herrera Fotografias




“FICO IMPRESSIONADO COMO TEM GENTE QUE SE QUEIXA DA VIDA QUE TEM”

Era um sonho e eu entendi que não poderia ser real. Sempre fui pobre, nem bola eu tinha. A gente colocava no pé tudo o que rolava e tentava fazer futebol. Para criança pobre tudo é motivo para inventar, almejar e usar a criatividade para se divertir. Meu pai não podia nem ver, ralhava com a gente e logo colocava para trabalhar no tijolo. Ô vida difícil, era melhor sonhar.

Como era bom pensar que um dia a gente ia virar craque de futebol e rodar o mundo se divertindo com a bola no pé, mas que jeito? Tão pobre! Só dava para assistir aos jogos do bar do seu Tião, mas o pai não podia nem sonhar. Meu pai sempre foi contra sonhar acordado. Meu pai dizia que pobre tinha que se esforçar muito para colocar comida na mesa e se a gente quisesse virar homem e ter família era bom aprender a ter coragem para pegar no batente.

Hoje eu sei que o pai estava totalmente certo. Afinal, o que seria da nossa gente se não fosse a olaria? Eu chorei quando quis ver o jogo e meu pai sentiu minha falta, ele foi ao bar do seu Tião e me tirou de lá na surra. Que vergonha! Eu só queria assistir, mais nada. Depois daquilo, eu perdi o gosto pelo futebol, trabalhei duro, cresci e nunca mais quis saber de bobagem de bola.

A vida sempre foi muito difícil mesmo. Uma loucura poder comprar um pedaço de charque. Muito complicado depois na fase adulta, mas eu tinha aprendido com meu pai, trabalhar com suor no rosto. Consegui uma mulher guerreira, bons filhos e tivemos nossa casinha, nossas coisas com muito esforço, nenhuma regalia. Fico impressionado como tem gente que se queixa da vida que tem. Faz festa, come bem, dorme no quentinho e as crianças brincam felizes, brinquedo e água do mar.

Ainda reclama?

Tem que agradecer todo dia porque não é fácil ver filho com a mão calejada não. Eu, quando pude comprar televisão, lembrei do pai. Veio a Copa e eu já estava velho, lembrei do pai. Eu entendi o pai, tinha que educar a gente. O compromisso de um pai é muito grande. Pai também sente medo de faltar as coisas, pai sofre de angústia da incerteza, mas tem que honrar, tem que ensinar e mostrar que vai ficar tudo bem.

PAI QUE É FORTE COLOCA FILHO NOS EIXOS. Eu senti orgulho do meu pai. Ele foi um bom homem, cuidou bem da gente. Naquele dia eu me permiti assistir o jogo com meus filhos e senti felicidade de estar com minha família. Eu só agradeço a Deus por tudo o que vivi e por tudo o que aprendi. O trabalho só ajusta a gente. O trabalho transforma em homem de bem.
VICENTE
24/06/18
-----------------------Paula Alves-------------------
“ELA TRANSFORMOU UMA VIDA, NUM MOMENTO MUITO ESPECIAL”

Eu via os meninos na pracinha e sempre tive vontade de correr e colocar aquela bola no gol. Sei lá, eu sempre achei que fosse possível. Do jeito que eles faziam parecia tão fácil. Eu observava e poderia passar horas na mesma posição admirando os movimentos deles. Eu ficava hipnotizado com os dribles e com a alegria que sentiam quando ganhavam o jogo. Eu sentia a euforia e o mais importante é que depois eu sonhava. COMO ERA BOM SONHAR COM O JOGO.

Eu era perfeito, eu tinha vitalidade, eu corria e marcava gol. Era maravilhoso sentir como se tudo fosse real. SÓ BEM MAIS TARDE, QUANDO CHEGUEI AQUI, FUI SABER QUE ERA REAL MESMO. Incrível como tem grupo de afins de todas as qualidades. Tem o grupo dos esportistas e daqueles que amam os esportes. Acho que isso me manteve vivo por tantos anos. Eu não teria suportado se minha realidade fosse só de sequelas. Eu adorava dormir e quando minha mãe deixava tudo pronto para o sono eu ficava feliz porque naquele momento eu viveria minha felicidade. Eu era o camisa 10.

Eu era especial e todos gostavam de ser meus amigos. Eu era normal entre eles. Então, aquele dia na pracinha, quando choveu, não teve jogo e eu fiquei decepcionado. Mamãe me entendia. Ela sempre percebeu no meu olhar a necessidade que eu tinha de estar no meio deles. Ela ficava chateada de ver como me olhavam. Eu era esquisito, ali meio morto na cadeira de rodas. UMA MENTE PERFEITA, MAL SABIAM ELES. Passavam cochichando e rindo, coisa de moleques. Eu não ligava porque já estava acostumado, eu só conhecia aquilo da vida, mas minha mãe ficava irritada. O pai falava que ela não devia me levar lá. Os vizinhos comentavam e a mãe dizia que eu ia porque gostava. Ela não ia me privar de minha única alegria.

Bom seria se eu pudesse jogar com eles. Minha mãe sempre pode me ouvir os meus pensamentos.
Como as mães são sábias!
Deus é tão poderoso e supremo que coloca a mãe para cuidar dos filhos. Coloca a mãe para ouvir os pensamentos dos filhos. As pessoas deviam respeitar mais as mães e, se elas tivessem a certeza do quanto são especiais, conseguiriam muito mais do que isso. Lembra dos prodígios que se referiu Jesus? AS MÃES CERTAMENTE ATINGIRIAM ESTES PRODÍGIOS.

Um dia, todos terão esta certeza. Eu agradeço minha mãe por tudo o que ela fez por mim. Sem ela minha expiação teria sido terrível, mas ela transformou uma vida, num momento muito especial. Com todo o meu amor.
ONOFRE
24/06/18

----------------------Paula Alves---------------------

Como tudo na vida sempre existiram as situações onde as pessoas afirmaram que as mulheres estavam proibidas de realizarem alguma coisa. Eu queria jogar futebol. Eu queria participar dos torneios. Eu queria estar entre eles e ser uma jogadora. Ouvi tantas coisas ridículas. Sempre foi puro preconceito. Como tudo.

A mulher não pode trabalhar fora porque ela deve ser a escrava do lar. Ridículo! Trabalhar horas e horas de forma incansável, fazer por todos e ouvir que não faz mais do que a obrigação.

A mulher poderia fazer trabalho de homem no lar, mas não fora dele. Já viu homem que chega cansadinho em casa e não serve nem para trocar o gás, trocar a lâmpada? Pois é! Mas, na rua, ela é donzela. Não pode sair coitada, tem que ficar presa, enclausurada.

Ouvi meu pai falar tantas vezes que eu tinha que me preparar para casar, ter filhos.
Por que eu queria estudar? Como é?
Ele falava que a gente não precisava saber ler.
Acredita nisso?
Era luxo saber ler?
Votar? Pra quê?

As mulheres eram consideradas inferiores mentalmente. Tudo isso aconteceu bem perto de nós, num passado não tão distante. Muitas situações embaraçosas, discriminatórias, horríveis infringiram a lei que deveria proteger as mulheres como a qualquer outro ser vivo. De fato somos todos iguais e eu sou muito grata a Deus que permite que sejamos homens e mulheres em determinadas encarnações dependendo da nossa necessidade evolutiva. Isso porque acredito que, apenas sentindo na pele, algumas pessoas valorizem o respeito e a dignidade alheia. Eu não pude chegar perto do futebol enquanto fui mulher. Infelizmente, precisei me contentar a tudo aquilo que era permitido para nós. Eu tive que aceitar e senti no fundo do meu ser que era assim que tinha que ser. Confesso que não foi fácil. Sei que, ainda hoje, lembrando desta encarnação, eu sinto doer e me revolto. Acho que, um dia, teremos realmente a lei da igualdade imperando em todos os aspectos de nossa sociedade, assim como é em outros mundos, mas ainda existe muito diferença, muita covardia e muita impunidade.
Que Deus tenha piedade de nós.
LURDES
24/06/18

-----------------------Paula Alves----------------------


Eu ouvi tantas vezes: “Frangueiro!”, “Frango!”. Faziam co-có quando eu passava (risos). Mas, o interessante é que isso me motivou. Eu tinha raiva, isso me incentivou a superar minhas limitações motoras. Não foi fácil porque eu era baixo e lento, mas eu pratiquei, eu me esforcei. Todos os dias eu treinava e treinava mais, mesmo quando o cansaço chegava, eu tentava mais uma vez. Meu pai me viu chorar muitas vezes e falava: “Vamos para a horta, vamos colher, vamos plantar e esperar o tempo da natureza porque tudo tem seu tempo, assim como a plantinha precisa de um tempo, seu corpo também precisa de tempo. Um dia você será um rapaz e conseguirá atingir a rapidez e a força necessárias para ser um bom goleiro filho.”

Meu pai foi meu exemplo de homem persistente, paciente e amoroso. Nunca me deixou vacilar na fé. A fé em si mesmo é muito importante. Existem pessoas que são descrentes em si, são aqueles que se esforçam, são bons trabalhadores, mas são frágeis. Frente a algumas adversidades, eles esmorecem e tombam. A fé em si mesmo, impulsiona e permite que a gente passe por provas rudes, porém necessárias e isso te fortalece, te faz seguir em frente melhor do que antes. Eu tinha tanta fé em mim que me esforcei e aguardei o dia que tudo aquilo valeria a pena e deu certo. Foi só um jogo. Um jogo importante para mim. Era um jogo na escola, não tinha ninguém famoso, não tinha ninguém especial. Era eu, o meu time e o time adversário. Uma oportunidade quando o goleiro se machucou e eu que era o reserva poderia mostrar o que sempre quis. Eu consegui, naquele dia, eu segurei todas as bolas, eu fui um gigante na rede, eu fui ovacionado. Eu não me tornei um campeão, eu não fui um jogador de futebol famoso. Depois daquilo, eu comemorei e me senti tão feliz. UM ADOLESCENTE QUE SE REALIZA ERA ISSO O QUE EU ERA. Um contentamento por ter alcançado um mero objetivo. Eu trabalhei para aquela realização. O fato é que depois de adulto, depois de pai de família com um trabalho simples, sem nada demais, eu sempre me lembrei daquele dia. Tive a certeza de que tudo o que nós fazemos por alguém, incentivando esta pessoa, pode mudar a vida dela.

Deixando bem claro que o esforço é imprescindível. A pessoa tem que ser leal a ela mesma. A pessoa tem que ser sincera aos seus princípios, mas incentivar alguém como meu pai fez comigo. Incentivar para ter fé em si mesmo pode transformar alguém e isso é papel de todos aqueles que se sentem capacitados. Sabe quem são os capacitados? SÃO OS QUE ACREDITAM PENSAR COM A CABEÇA NO LUGAR. As pessoas que se sentem privilegiadas, não as ricas materialmente falando. As privilegiadas de saúde, bem estar físico e mental, as felizes, que estão conhecendo o Evangelho e sabem que podem doar muito mais do que pão. PENSEM EM LEVAR A LUZ PORQUE ISSO MUDA UMA SOCIEDADE.
MOURA
 24/06/18

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