Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“QUE
JUSTIÇA É ESTA?”
Quando
me sugeriram para voltar e recebê-lo como filho, eu recuei. Fiquei assustada e
temerosa. Ele havia me feito sofrer tanto que eu acreditava que não poderia
ficar perto dele. Como poderia carregá-lo nos braços? Mesmo com o esquecimento
do passado, seria impossível aceitar que ele seria meu filho. Eu fui estuprada
e foi um ato tão violento que nunca mais me recuperei psicologicamente. Nunca
mais permiti que um homem se aproximasse de mim. Quando no plano espiritual, me
informaram que receber aquele homem como filho, seria o melhor a fazer eu
fiquei espantada.
Que
justiça é esta? Eu deveria perdoar e amar meu inimigo, mas como? Não tinha o
que fazer. Eles já haviam decidido e tudo estava interligado. Tantas pessoas
interligadas em famílias próximas, tantos afetos que iriam nos auxiliar que eu
não poderia discordar. Fui enviada e durante anos eu evitei ser mãe. Me casei
com o amor da minha vida. Osvaldo sempre foi um marido maravilhoso e desejava
um filho, mas eu não sabia o que fazer para evitar a conversa onde ele me pedia
para ser mãe. Eu, de fato, nem sabia o motivo da recusa, mas ficava amedrontada
com a hipótese de trazer alguém ao mundo. Eu não era dada a religiões e ficou
mais difícil me convencer.
Meu
casamento já estava prestes a terminar quando eu tive uma notícia inesperada...
Estava grávida. Nem entendi como porque sempre tomei contraceptivos e não havia
condições para estar grávida, mas eu estava. Durante toda a gravidez fiquei
mal, muito incomodada, irritadiça. Era como se o mundo estivesse me fazendo
sofrer, viver uma coisa que eu não queria. Eu não o desejava em mim. Era
terrível aquela aproximação. Mas, tudo passa e os nove meses também passaram.
Quando ele nasceu eu não quis nem olhar. Rejeitei meu filho o tempo todo. Não
amamentei e olhava para ele no berço me irritando até com o sono dele. Disseram
que eu estava com depressão.
A
verdade é que eu não tinha felicidade com ele dentro da minha casa. Quem pode
entender doutor? Eu sentia que era ele, entende? Mas, o menino cresceu e
instintivamente ele fazia de tudo para ser amado. Fazia tanto que o amor
começou a brotar em mim, inconsciente eu fui sentindo. Amor não tem como descrever,
uma sensação estranha, vontade de abraçar e beijar. Preocupação com o bem estar
o tempo todo. Eu passei a nutrir um afeto por ele e quando me dei conta eu o
amava de forma incondicional. Daria minha vida por ele e ele, eu sei que faria
o mesmo por mim. Impressionante lei que nos une. Eu sou imensamente agradecida
de saber que Deus teve um plano para nós e que o Adonias reparou todo o mal que
me fez me amando como sua mãe.
SELENA
03/02/18
--------------------Paula
Alves----------------
“COISAS DE ADULTO COM MENTE DE CRIANÇA”
Nunca
desejei que ficássemos separados. Não sei o que nos afastou. Fomos criados
juntos e tivemos as mesmas coisas, o mesmo carinho dos pais e, se passamos por
dificuldades, tivemos os mesmos esforços primários. Fomos bem educados e não
compreendi o porquê nos distanciamos.
Eu
ainda o amo, mas fica difícil pensar em vê-lo. Sei que ele planejou muitas coisas
para me comprometer, sei que me invejava e eu sentia ciúmes dele com nossa
família. Coisas de adulto com mente de criança. A gente se separou de forma tão
brusca por causa de meia dúzia de palavras gritadas. Ofensas que me fizeram
sujar as mãos quando o agredi. Eu não queria, mas perdi a cabeça. O tempo se
passou e tudo piorou quando nossos pais morreram. Briga de herança é coisa
feia.
Ninguém
quer perder, mas na verdade já perdeu o que era realmente importante. O que nós
conseguimos nunca preencheria as lacunas do coração. Ele nunca se lembrou dos
bons momentos que vivenciamos e de todas as vezes que eu sorri, que eu o
defendi, que eu fui irmã dele. Não olhou para trás, simplesmente foi embora
para sempre.
O
que faz uma família ruir assim? Não devia ser assim. Eu ainda sinto falta
porque você pode formar outra família, mas existem pessoas que são
insubstituíveis. O nosso orgulho faz a gente afirmar o contrário. Eu consegui
vir para cá depois de muito tempo perambulando, louca por aí gritando que
precisava de ajuda, mas decidida a acabar com a vida dele. Nem me dei conta de
que ele estava me perseguindo, gritando como eu. Estávamos ligados pelo rancor
o tempo todo. Eu penso que quero vê-lo bem. Desejo que ele fique lúcido e que
possamos recomeçar. Nada importa agora para mim, apenas me certificar que
podemos viver em paz.
LUCÉLIA
03/02/18
----------------------Paula
Alves-----------------
“EU
SOFRI POR AMOR”
Eu
não queria que ela casasse. Sempre soube que ela era tudo para mim. Acho
injusta esta lei. Onde já se viu ter que ficar separado? Eu fiquei e ela teve
que voltar e ter uma nova vida. Tinha que casar, mas como? E eu? Não é assim
que funciona não. Não tá certo. Eu procurei por toda parte. Demorou muito
porque mandaram ela pra longe. Outro país, outra gente. Tudo pra encontrar com
ele.
Ela
nunca gostou dele e tinha que reparar. Reparar o quê? Não dá pra entender isso
não. Aí, achei. Achei, mas ela tava mudada. Outra cara, outro jeito porque
tinha uma família diferente da nossa. Quando achei, ela já tava diferente, tava
dando confiança para o mardito. Ai que raiva me deu. Tentei fazer uma arapuca
para ele, mas o cara era esperto e parecia me ouvir. Coisa de doido, ele me
ouvia e rezava o tempo todo. Foi esquisito porque a Otacília não me queria por
perto e pensava bem dele. Agora eu que era o errado e tava tentando separar o
casal. Inverteu sabe? Eu quase enlouqueci porque passei de defensor, de Romeu,
de herói à obsessor.
Que
triste. Minha mulher, minha amada me desprezando. Eu chorei muito e sofri quando
eles se casaram. Eu sofri por amor. Ver o casal junto me feria. Eu tive que
passar por muita coisa pra sair de perto deles porque chegou num momento que eu
nem conseguia me aproximar. Eles formaram um elo tão forte que fiquei de fora.
Eu não queria mais sofrer. Eu só queria que você me ajudasse para eu não
lembrar. Eu não quero mais me lembrar de nada disso.
LEVI
03/02/18
---------------------Paula
Alves-----------------
“SABER
E CONHECIMENTO SÃO PRA TODOS”
Eram
as tartarugas marinhas que me encantavam. Quanta beleza existe no oceano. A
vida é muito bela e tem gente que não sabe admirar. Quando encarnada eu sabia
ver e sentir tudo nos detalhes que meu corpo possibilitava, o vento, a chuva, o
som da natureza, grilos e mar, mas depois que desencarnei, quanta magia!
Tudo
é lindo demais por aqui. Têm outras cores, outros aromas. É como um vislumbre.
Eu sou imensamente agradecida por ter chegado aqui. Fui tão bem acolhida, me
sinto como uma estudante, uma pesquisadora. Tudo me fascina e eu não canso de
observar.
Vocês
todos são belos demais e meu aspecto também está mudado, tão jovial, tão vivo.
Chego a pensar que lá era só ilusão. Na carne tudo ofusca, mas não é de
verdade. É um aglomerado de matéria que nem se preenche de verdade. É estranho.
Os sentimentos são limitados, as ideias prolixas, tudo irreal. Eu desencarnei
jovem, foi um golpe brusco, um caminhão. O corpo ficou irreconhecível e quando
acordei estava aqui, tão bem. Disseram que eu vivi o que escolhi. Passei pelas
provas necessárias e as encarei com simplicidade, com gratidão. Tive
dificuldades sim, faltou até o que comer, mas eu encontrei gente tão boa.
Vizinhos que levavam o que a gente precisava na hora certa. Era mamãe e eu, nós
trabalhamos duro e nunca mudou a vida, sempre difícil. Faxina e grana pouca.
Eu
adorava as tartarugas, mas quem dera poder estudar. Coisa de rico. Aqui não tem
disso. Saber e conhecimento são pra todos, para quem quiser. É muito bom. Só
agradecer porque antes do acidente minha mãe conheceu um cara legal. Um homem
bom pra ficar com ela. Foi ele quem ajudou a resolver tudo. Tão difícil pra
mamãe. Eu sei que ela sofreu muito e eu queria tanto que ela soubesse de mim.
Que eu estou tão feliz aqui. Ainda mais depois que eu soube que a gente vai se
ver de novo.
Aqui
o tempo passa tão rápido, é um piscar de olhos e ela já vai ter passado por
tudo o que precisa, deixando aquele corpo cansado e vem pra junto de mim. Eu to
torcendo pra dar tudo certo pra ela também. Não desistir, fazer tudo com
bondade, com gratidão, saber apreciar o que Deus faz na nossa vida e logo, logo
a gente vai estar se abraçando de novo.
BIANCA
03/02/18
-------------------------------------Paula Alves---------------------------------
-------------------------------------Paula Alves---------------------------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“NENHUMA
DATA CORROMPE AS PESSOAS VALOROSAS”
Cheguei
feliz para dar a notícia. Eu faria tudo por aquela negra. Oh! Mulher bonita. Eu
me apaixonei por ela menino ainda e nunca imaginei que não era correspondido.
Me esforcei tanto. Trabalhei duro e, embora meus recursos financeiros fossem
tão sutis, eu acreditava que podíamos ser felizes com todo o meu amor.
Consegui
comprar um barraco perto da mãe dela e corri pra avenida para dar a notícia à
Cibele. Eu andei pela concentração e tive a certeza de que meu amor poderia
superar qualquer coisa. Qualquer dificuldade financeira, qualquer crise seria
superada pela força dos meus sentimentos, mas não imaginei que aquilo pudesse
acontecer.
Cheguei
com a chuva e quando me deparei com a cena, eu gritei escandalizado. Ela o
beijava com tanto fulgor... Era indecente, era ofensivo. Foi cruel ver como ela
o agarrava. Ela era minha noiva e eu tinha o maior respeito por ela que seria a
mãe dos meus filhos. Como podia ser uma versão tão promíscua da minha noiva?
Eu a
odiei. Eu quis vê-la morta doutor. Eu desejei nem existir a ter que assumir
tudo aquilo. Assumir que fui enganado nos meus mais sinceros sentimentos. Eu a
amei como a alguém que se idolatra e ela me enganou.
Não
é só pelo orgulho que explode no peito. É pelo arrependimento de se doar
inteiramente, enquanto a outra pessoa zomba dos seus nobres sentimentos. Ser
enganado, se sentir fragilizado pela falta de lealdade dói.
Eu
nem soube o que fazer. Quis chegar perto dos dois e bater, acabar com eles, mas
minhas pernas fraquejaram e eu fiquei como uma criança acuada. Fui embora e
devolvi a chave do barraco, me preparei para ir embora. Minha mãe tentou
justificar e falar do Carnaval. Ninguém é de ninguém, comemoração do Satanás,
filho! – disse ela. Mas, ninguém obrigou a Cibele a me trair. Nenhuma data
corrompe as pessoas valorosas.
Quem
ama, não brinca com os sentimentos do outro e nem coloca os impulsos, os
desejos em primeiro lugar. Me despedi da mamãe e fui embora. Eu nunca consegui
esquecer o que aconteceu e sei que isso fez parte da minha vida porque nunca me
casei e nem consegui formar família. Eu não confio nas pessoas doutor. Talvez
seja muito orgulhoso mesmo, achando que as pessoas sempre cometem erros e que
eu sou o certinho, sei lá. Como é possível reverter esta situação?
SUZANO
11/02/18
----------------Paula
Alves---------------
“A
EMOÇÃO DE OUVIR O TAMBORIM É INENARRÁVEL”
Foram
mais de vinte anos com as vestes pesadas girando na avenida. Roupas que levaram
meses para serem feitas. Tanto trabalho para confeccionar e me tornar uma
baiana. A emoção de ouvir o tamborim é inenarrável. O coração pulsa mais forte.
Os pés entram em cadência e eu girava feliz. A família toda achava estranho, já
velha na passarela, mas eu não ligava, girava feliz.
No
ano derradeiro, fui avisada pelo médico que meu estado de saúde era grave. O coração
estava tão fraquinho, ele achava que eu não suportaria mais um carnaval, mas o
carnaval era toda a minha alegria. Minha vida sempre foi dura demais. Mãe
solteira, pobre, morava num barraco tão apertado, tudo tão difícil, só sobrava
alegria no carnaval.
Ilusão?
Eu
nunca me importei com palavras. Eu queria sentir, mais do que fome, sofrimento
e cansaço, eu queria me alegrar. O carnaval era o único momento em que eu me
sentia parte integrante de alguma coisa. Como se as pessoas tivessem o mesmo
ideal que eu. Eu não era mais sozinha lutando, eu tinha um grupo inteiro
lutando comigo na apoteose.
O
médico falou que eu não poderia desfilar e meus filhos me proibiram. Eu fugi.
Peguei minha enorme fantasia de baiana e fugi de casa e dos meus filhos. Eu
desfilei e fui feliz mais uma vez, eu senti mais uma vez. Dois dias depois eu
desencarnei. Antes disso, eu falei para os meus filhos que o maior presente foi
ter desfilado mais uma vez.
Quando
cheguei aqui fui tão bem recebida. Estava alegre e animada, não sofri, vim
direito para cá. Me informaram que todos os Espíritos devem fazer o processo de
evolução, enquanto estão encarnados. Todos devem aprender tudo, pouco a pouco.
Aprender em artes e ciência, mas também devem aprender em sentimentos
adquirindo as virtudes. Eles me explicaram que o que eu sentia com o carnaval
me fez avançar nos sentimentos. Se não fosse isso, possivelmente eu teria
retornado mais endurecida pelas dificuldades que enfrentei.
Eu
sou muito grata por ter nascido no Brasil, numa comunidade onde as pessoas
vivem o carnaval.
SÔNIA
11/02/18
----------------Paula
Alves---------------
“ESTRANHO
PORQUE QUANDO NÓS DESEJAMOS COM TODO O CORAÇÃO, A VENDA CAI”
Eh!
Pingaiada! Como foi divertido tio. Muita farra e brincadeira. Minha vida foi só
diversão. Eu achei que pudesse burlar as regras para sempre e, de repente, me
deparei com esta nova realidade, cheia de responsabilidades e seres de todos os
tipos.
Durante
minha última encarnação, acreditei que com todos os amigos que eu tinha e
também com a família facilitando tudo, eu poderia me privar dos sacrifícios e
viver a alegria, mas não era bem assim.
Foram momentos muito
prazerosos, onde o dinheiro pode comprar tudo. Ostentação, drogas, garotas,
bailes, tudo de bom. Parecia que era só isso e eu não tinha que ter muito
esforço mesmo, fui vivendo.
Desencarnei
num baile de carnaval porque flertei com uma linda jovem que estava
acompanhada. Levei uma facada e morri em breves instantes. Eu fiquei preso
naquele baile por décadas. Já não aguentava mais as mesmas músicas, os mesmo
drinks, os mesmos entorpecentes e desejei a lucidez. Eu estava tão confuso e
desejei ser consciente.
Estranho
porque quando nós desejamos com todo o coração, a venda cai.
De
repente, eu vi tudo. Revi minha vida e minha morte. Eu percebi que tudo o que
fiz, foi não ter feito nada e viver na brincadeira o tempo todo. Eu percebi o
quanto perdi e chorei. Eu quis ter feito diferente. Eu me lembrei dos meus
propósitos, dos meus planos e do que deveria ter feito para ter retornado
jubiloso. Percebi também o quanto antecipei o meu retorno e as pessoas que
estavam contando comigo e nunca tiveram o meu apoio.
Eu
devo viver com isso, enquanto um novo plano se firma para mim. É difícil ter
certeza de tudo isso e poder prosseguir independente do remorso. Eu agradeço o
espaço e também pela sensação prazerosa de alívio.
ÁLVARO
11/02/18
---------------------------Paula
Alves----------------------------
“MAS A DIGNIDADE DE MÃE É SUPERIOR A TUDO E EU
ME VIREI”
Ele
era músico. Eu o conheci numa roda de samba e me apaixonei pela música que ele
tocou. Meus olhos brilharam quando vi o dono da voz. Marcos era incrível. Foi
difícil me aproximar porque todas queriam estar com ele, mas depois de dois
meses, ele me viu. Nós saímos e eu tive que me acostumar com tudo. Com as
festas, com as músicas, as bebidas e as fãs. Mas, eu o amava e era fascinada
por ele. Sabia que a música era sua paixão e eu nunca seria capaz de me opor ao
seu talento.
Nós
nos casamos e fomos felizes por um tempo. Até que eu engravidei e não pude mais
acompanhá-lo. Ele não achava certo que eu o acompanhasse e pudesse comprometer
meu bebê nos bailes. O carnaval chegou e nosso filho estava prestes a nascer.
Nascerá no carnaval! – dizia ele contente.
Eu
deveria ficar em casa, enquanto Marcos sairia para tocar e cantar. Fiquei
indignada, não aceitei que ele saísse porque eu já estava sentindo as dores do
parto. Eu não queria me opor à música e ao trabalho no carnaval, mas e eu? E
nosso bebê?
Naquele
momento eu soube que seria sempre um segundo lugar para nós. Eu e meu filho
sempre no segundo lugar, sempre poderíamos ser rebaixados porque a escola
receberia a nota máxima em sua vida.
Eu
peguei as malas, tudo o que pude carregar e fui embora. Pedi asilo na casa dos
meus pais que me acolheram muito mais pelo tamanho da minha barriga do que por
qualquer outra coisa. Naquela mesma noite nasceu o Dimas. Meu filho me encheu
de esperança e um amor tão grande que eu seria capaz de suportar tudo por ele, mas
a dignidade de mãe é superior a tudo e eu me virei.
Marcos
veio atrás de mim, levou quatro dias para nos procurar. Na quarta de cinzas ele
se lembrou da família e eu já tinha decidido muita coisa. Eu falei com ele,
exigi o registro, exigi o auxílio para o menino e exigi que ele nunca mais me
tratasse como sua esposa porque eu merecia mais do que um amor de inverno. Eu
queria ser amada durante o ano todo. Queria ter exclusividade e queria que
fossemos importantes para alguém como a música era para ele. Eu abri mão do
Marcos e fui feliz sem ele. Estranho como é bom sentir-se livre.
Ele
sempre teve contato com o filho e nunca mudou. Teve outras mulheres que também
não conseguiram dividi-lo com o carnaval. Eu me transformei numa grande mãe e
fui observada por um homem maravilhoso que se tornou meu esposo tempos depois.
Sou muito agradecida ao Marcos pelo compromisso que tivemos. Algumas pessoas só
se esbarram para concretizar os planos, de outro modo nunca seriamos pais do
Dimas.
Meu
filho foi tudo para mim. Ser de luz que me auxiliou ensinando uma série de
coisas especiais para meu aprendizado. Graças a Deus.
ESTEFÂNIA
11/02/18
------------------------Paula Alves----------------------
-----------------------Paula Alves--------------------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“VENDER O ALMOÇO PRA COMPRAR A JANTA.”
“NÃO DEU”
Eu
até tentei, mas não era pra mim. Vida miserável! Só trabalho o dia todo e nada
de alegria, nada de felicidade. Vender o almoço pra comprar a janta. Não deu.
Eu
passei muita miséria na infância. Trabalho duro na roça, comida pouca, sempre a
mesma coisa, surra todo dia porque eu era preguiçosa?
Será?
Por
acaso aquilo era vida pra criança?
Eu
tive culpa por que eles tiveram um bando de filhos?
Fala
sério, eu era criança e queria brincar. Eu não servia para lavoura, eu queria
um brinquedo, só isso. Mas, tudo bem, cresci e a vida continuou difícil. Também,
semianalfabeta pode querer o quê? Meus pais sempre me negaram tudo o que era
bom porque eu era mulher, porque eu era esposa, mãe, cristã.
Não,
aquilo não era vida de gente. Eu não vou te falar que eu não os amava. Amor eu
tinha, mas não tinha ânimo para viver no sofrimento por mais tempo. Aquele
casamento que foi arranjado com outro pobre como eu. Por umas terrinhas que não
rendiam nada e só me fizeram trabalhar ainda mais. Emprenhei e de enxada na
mão. Queria não doutor. Queria não.
Entreguei tudo para Deus.
Três filhos e um marido medroso, covarde. Fui embora. Não arrependi ainda.
Larguei tudo para trás e fui viver onde ninguém me conhecia. Depois de anos,
arrumei outro homem e casei de novo. O danado era da igreja e quis colocar
cabresto. Eu tentei de novo. Saia comprida, véu, tudo o que tinha de ter eu
fiz. Orei, tentei seguir, mas de novo não deu. Eu queria dançar, viver a
vontade.
Não
sei te explicar, mas acho que este sentimento de cristão, de servo que se curva
não brotou dentro de mim. Eu gosto de ser livre. Eu vejo esta moça aí e nem sei
o que passa na cabeça dela. Viver pra satisfazer os outros, viver para solucionar
os problemas alheios. Que felicidade é essa?
Não era pra mim. Também vou
te falar, fazer de falsidade acho que não é solução porque Deus vê tudo e sabe
do interior da gente, nisso eu creio. Preferi seguir na sinceridade. Seguir
minha vida livre.
Eu separei dele, arranjei um
emprego e fui viver sozinha. Dancei muito, tive minhas amizades e meus namoros,
fui feliz do meu jeito, mas tinha sempre um peso na minha consciência que eu só
descobri quando cheguei aqui.
Essa história de plano é
duro. O tal do plano tem que ser seguido, por isso, que Ele disse que a
felicidade não é deste mundo. Porque, às vezes, você não faz na felicidade, faz
na obrigação. Faz porque tem que fazer e pronto. É assim, nem sempre pelo amor,
nem sempre de comum acordo, mas porque tem que ser feito. Eu recusei tudo.
Todas as minhas obrigações foram recusadas para viver uma liberdade que não me
pertencia. Eu falhei de novo. Da próxima, sabe o que escolhi? Incapacidades
físicas. Só assim doutor. Senão, erro de novo.
BERNARDETE
17/02/18
----------------Paula
Alves--------------
DESDE
QUANDO ORAÇÃO DERROTA ALGUÉM?
É
uma coisa doentia esta de ligação. Eu fui apaixonado pela mulher que na outra
era minha filha. Depois, eu ainda quis perseguir. Sei lá, muda tudo na cabeça
da gente quando a gente tem o histórico. Eu esquecia e ficava correndo atrás
dela. Cheguei a perseguir, enquanto a pobre estava crescendo. Num corpo
infantil, frágil ainda, e eu querendo cobrar satisfação.
A
mente da gente é um troço estranho. Como obsessor eu vivi um dilema terrível
porque tinha acesso a algumas imagens e as lembranças eram reveladas como se eu
fosse a vítima e queria cobrar. Não me orgulho de nada e reconheço que errei,
mas demorou muito pra chegar nesta fase.
A
menina de quatro anos chorava sem parar só de sentir minha presença. Eu não
fazia nada, nem conseguia chegar perto dela porque tinha sempre aquela senhora
para defender. A senhora era a protetora. Nem deixava chegar perto, isso me
irritava bastante. Mas, a coitada da menina chorava e a mãe ficava desesperada
pensando que a menina estava doente. Que nada, era eu. Eu achei estranho ver
aqueles dois fazendo de tudo para tratar a menina bem, pra ela ficar tranquila
e contente. Justo eles que, um dia, fizeram mal para nós dois. Eles
atrapalharam tanto e impediram nosso enlace. Eu não podia suportar a união
deles, dos três. Eu até tentei atacar, mas a senhora não deixava. Tinha muito
Espírito naquela casa e vinham dizer que a culpa do choro era minha. Cada um
ali tinha seu acompanhante e ainda tinha a mulher que cuidava da casa deles,
também era um Espírito e eu era o único ruim?
Eu
ainda não entendo. Tem muita coisa voltando aos poucos. Só sei que, de repente,
eles começaram a orar. Toda semana tinha oração. Pra quê? – eu pensei. De
início achei que estavam orando para acalmar a menina, mas depois eu percebi
que era pra mim. Estavam orando pra mim. Pra me afastar dela. Ah! Fiquei
nervoso. Oração?
Desde
quando oração derrota alguém? Mas, quando chegou o grupo de branco me
explicaram que ninguém queria me derrotar, queriam me ajudar a perceber que só
a bondade faz bem pra gente.
Queriam
que eu tivesse lucidez. Eu aceitei vir para cá. Aceitei me modificar e
abandonar a vida de sofrimento. Decidi olhar pra mim porque eu estava mal mesmo
e a menina já foi alguém que eu amei muito. Hoje eu estou me esforçando para
recomeçar, ainda falta muito para ser bom, mas mal já não quero ser.
IZIDORO
17/02/18
--------------------Paula
Alves----------------
“EU
NASCI PARA SER MÃE E QUERIA TER UNS QUATRO FILHOS”
Eu
lembro o parto e da vontade que eu tive de ver a carinha dele. Lembro da
correria no hospital. Eu me senti mal, falta de ar, suava frio. O bebê parecia
estar agitado e apressaram meu parto.
Em
casa estava tudo arrumado. Eu cuidei de tudo com tanto carinho. Preparei cada
peça, bordei, lavei, arrumei o quartinho com tudo o que pude. Meu esposo era um
coruja, um fofo. Me enchia de carinhos, dizia que estava linda. Eu me senti
linda mesmo, aquele barrigão. Eu nasci para ser mãe e queria ter uns quatro
filhos, mas alguma coisa deu errado. Não sei por que. Eu tive uma gravidez
tranquila, super saudável e na hora do parto aquela correria, aquela aflição.
Estou aqui no hospital há
quatro dias e não consigo entender por que ainda não vi meu bebê doutor. Não
recebi nenhuma visita dos meus familiares. Meu esposo deve estar aflito para me
ver e ninguém me explica o motivo de estar fazendo um tratamento psicológico.
Eu não compreendo. O senhor já me pediu para ter calma e vive falando que eu
tenho que relembrar, mas relembrar o quê? Eu quero minha casa e minha família e
toda vez que me agito me pedem para voltar pro quarto e eu durmo por horas, na
verdade, mais parecem dias inteiros. Não sei o que está acontecendo.
Às
vezes, eu tenho a sensação de que perdi tudo. Perdi todas as possibilidades de
ser mãe. Eu me sinto tão frustrada porque sinto que não vou poder desempenhar
minha tarefa de mãe. Eu tenho umas lembranças estranhas de uma pessoa que não
era eu e que maltratava os filhos. Uma mulher ignorante que privava os filhos
do básico. Por que alguém faria isso doutor? Eu nunca faria isso com meu filho,
nunca.
ISAURA
17/02/18
-----------------------------Paula Alves-------------------------
“SÓ
EXISTE O CADA UM POR SI.”
“COMO
CONFIAR?”
O
colar de pérolas não era para ser dela, era para ser meu. Tudo aquilo era para
ser meu. A vida toda fiquei perto dele. Fui amiga, confidente, aguentei toda
ira, leviandade, toda bebedeira e não fui cortejada. Infeliz de mim. Eu não vou
tolerar ouvir que estava obcecada. Não era isso. Eu me senti ofendida. Amor?
Não acredito que saiba o que é amor, mas como toda criatura. Ninguém sabe o que
é amar. As pessoas fingem. São sarcásticas e cruéis. Só existe o cada um por
si. Como confiar?
A
verdade é que quando você precisa de alguém, as pessoas te dão as costas. Eu já
tentei usar de sinceridade, eu já tentei ser amiga, ser leal, o que eu ganhei?
Amargurada?
Não
é bem assim. Isso são apenas palavras, não me definem. Eu sei que todas as
vezes que tive necessidade de um ombro amigo, fiquei chorando sozinha e mesmo para
comemorar, só com o bolso cheio de dinheiro, senão você é nada, entendeu?
Pode
ser feio de ouvir, mas é a minha verdade e é isso o que me interessa agora.
Nunca na vida recebi afeto sincero e nem sinto falta de quem quer que seja.
Aquele colar de pérolas deveria ter sido meu e ele se casou com ela. Viveram
muito bem e depois que eu padeci, vim para esta vida, eu não poderia ficar
longe deles? Por que foi que fiquei colada naqueles dois? Eu nunca quis.
Simplesmente fiquei dentro da casa deles por dez anos. Vendo aquela mulher
horrorosa com o colarzinho no pescoço, enquanto o marido fazia tudo o que não
devia por aí. Eu queria sair, me livrar deles e não conseguia abrir a porta. Eu
estava presa na felicidade fajuta dos dois.
A
irmã dela parecia me ver. Ficava olhando para minha direção e chorava. Ela
tinha pena de mim, tem sentimento pior que pena? Ela que era uma coitada, ficar
passando mal por causa de uns esfarrapados como eu. Orou tanto que atraiu um
bando para o lar. Chegaram dispostos a me ajudar, mas eu não confio em ninguém,
não tem jeito. Agora dancei né? Fazer tratamento para retornar. Não estou
entendendo como isso pode ajudar porque eu vou renascer como filho do
cafajeste. Filho dele com outra mulher e esta esposa que não percebe nada.
O
plano é que ela me acolha em sua casa. Pode? E eu tenho que confiar que vai dar
certo tudo isso? Eu não quero ir, prefiro ficar por aqui mesmo.
ARLETE
17/02/18
-----------------------Paula Alves--------------------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“JULGUEI TODOS COMO UM SÓ”
Família
coisa nenhuma. Eu sempre estive presente. Nunca me omiti ou deixei que faltasse
qualquer coisa para eles. Naquela ocasião eu precisava do apoio. Eu precisei
deles. Meu filho só tinha quatro anos. Nós estávamos todos juntos. Eram
churrascos e festas de todos os tipos. Casamentos, batizados, festas de
aniversário ou reuniões para matar a saudade. Sempre nos divertindo com primos,
sobrinhos, tios e avós, mas eles se afastaram de nós.
Quando
o Murilo começou a se sentir mal, no ato, procuramos o pediatra. Minha esposa
ficou desesperada com a mudança do garoto. Sempre fomos pais tranquilos, mas a
palidez e o cansaço eram visíveis. De cara precisamos de doação de sangue e
nesta, vários não puderam ajudar. Tinha desculpa para tudo, mas a verdade é que
foram poucos que ajudaram.
Depois
disso, ele piorou mais e eles visitaram no hospital se comportando como se o
menino fosse morrer naquele mesmo dia.
O
fato é que, depois de algumas semanas, ele não morreu, porém piorou
extremamente, não sobrou ninguém, apenas eu e minha esposa. Todos se afastaram.
Diziam até que sofriam muito por ver o estado em que estávamos, coitadinhos né?
Será que sofriam mais do que nós ou o garoto que estava todo cheio de
cateteres?
Eu
me frustrei com minha família e percebi que, em dia de festa, estavam reunidos,
mas na dor não podíamos contar com eles.
Murilo
saiu do hospital e precisou de quimioterapia. Naquela época, o diagnóstico era
fatal, só tínhamos que esperar o tempo de Deus e tratar com o que tinham
disponível, que mais destruía o corpo do que o próprio câncer.
Em
casa até recebemos algumas visitas que choravam na frente do menino deixando-o
assustado. Fiquei com vontade de proibir, mas não foi preciso, eles nunca mais
voltaram. O pior é que ficamos sabendo das diversas ocasiões que se reuniram
sem nós. As festas continuaram, as comemorações sempre existiram sem nós.
Enquanto estávamos no hospital ou sofrendo no lar, eles tinham motivos para
curtir e se alegrar. Eu sei que dentro de mim tem rancor, um fel escuro que
fere meu coração e sei também que foi isso que me aniquilou pouco a pouco,
depois que meu filho morreu. Eu não quis vê-los. Julguei todos como um só. Não
senti vontade de visitá-los e só os recebi no velório porque não tive forças
para lutar contra eles.
A
dor de perder um filho é pior que tudo. Eu virei um bagaço. Tive pena da Laura,
minha esposa, mas não pude consolá-la. Eu não consegui. Eu vi minha vida
destruída quando perdi meu filho. Estou aqui me tratando para perdoar e
perceber que as pessoas só dão o que tem. Eu não concordo e sei que está
difícil para me tratar. Meu filho resgatou.
Foi
um garoto tão corajoso. Foi bem recebido no plano espiritual e já veio me ver.
Ele tentou me clarear a mente, tentou me ajudar. Ele é excelente. Um Espírito
de luz que me faz enxergar o que há de melhor nas pessoas. Peço a Deus coragem
e discernimento para prosseguir.
JOÃO
PAULO
25/02/18
-----------------------------------Paula
Alves------------------------------
“MAS
EU ESCOLHI NÃO FAZER NADA”
Eu
sei que muitos dirão que não dá para entender porque eu tinha tudo. Todas as
possibilidades, todos os recursos, família e intelectualidade. Eu tinha e me
sentia vazio. Era como se nada pudesse me fazer sentir bem. Eu não quis mais
continuar. De repente, parei com tudo e só observava a janela. De onde eu via,
conseguia perceber a correria das pessoas, sempre atrasadas. Seus carros
impecáveis e, ainda assim, tinham que trocar.
Vi o
vizinho que tinha duas namoradas, elas eram tão apaixonadas e nunca se
encontravam, ele ria.
Vi a
mulher do cachorro quente, trabalhando até em dia de chuva, tão esforçada, mas
ali ninguém queria cachorro quente.
Via
a babá passeando com o garoto, ele chutava a canela dela todo dia. Era tão
abusado e a pobre só estava trabalhando. A professora que comia a maçã nunca
olharia pra mim. Eu via a chuva e tomava um pouco de sol, tudo na mesma janela.
Até pensei que meus pais iriam notar, mas não. Ela estava tão preocupada em
fazer as malas. Tinha que viajar para Paris. Eu fui ficando, nem notei meu
emagrecimento, não notei a tosse. A pneumonia se instalou e eu não quis
procurar o médico. Quando vi já estava fora do corpo. Tanta dor e a tosse, a
mesma janela.
Aos
poucos, as pessoas foram aparecendo. Veio ela e a empregada para decidir o que
seria feito do meu quarto. A casa era tão grande e ela precisava do quarto? Eu
não queria sair, fiquei ali e a empregada sentiu. Falou que era mal assombrado.
Eu
ri. Vida difícil a minha, virei fantasma. Sei lá quanto tempo passou olhando a
janela. O quarto nem tinha mais os meus móveis, nada e eu olhando a janela.
Ninguém muda doutor. As pessoas vivem a mesma vida de sempre. Eu não tenho
ânimo. Foi um suicídio involuntário. Eu não queria viver, mas também não iria
me matar, aconteceu que fui irresponsável. Não me cuidei como deveria e o meu
corpo não aguentou. Eu já soube que tinha algumas coisas importantes para
resolver, inclusive com aquelas pessoas, mas fui um covarde, um acomodado. Nós
devemos interagir com o mundo o tempo todo porque assim, podemos trocar
experiências e aprender, evoluir. Eu fiquei preso, eu mesmo me enclausurei e
não fiz mal a ninguém, mas também não fiz o bem e prejudiquei a mim mesmo, uma
vez que destruí meu corpo por falta de cuidados e ainda desperdicei chances de
reconciliação.
Eu
deveria me aproximar da professora e constituir família com ela. A mulher do
cachorro- quente deveria ser admitida para trabalhar na nossa casa, assim como
a babá cuidando de minhas filhas, ela teria coragem de falar para a mãe do
garoto o quanto ele a maltratava e precisava de educação mais rígida. O vizinho
iria ouvir de mim um sermão sobre leviandade dos homens, como devemos respeitar
as mulheres. Tudo isso poderia ter acontecido se eu não tivesse preguiça, se eu
me esforçasse. E tudo isso iria mudar drasticamente a vida de todos eles e a
minha também, mas eu escolhi não fazer nada.
GABRIEL
25/02/18
----------------------------------Paula Alves---------------------------
“O
PAI ACEITOU NA HORA”
Eu
nunca gostei de estudar. Abandonei a escola e me entreguei a um trabalho que
não dava nem para pagar o aluguel, isso tudo por comodismo. Eu tinha tanta
coisa pra fazer. Com meus estudos eu ia ajudar tanta gente. Poderia ter dado
certo. Eu escolhi a prova que tinha a ver comigo. Meu caráter sempre indicou
que eu precisava avançar em intelecto e eu deveria estudar. Tudo foi favorável.
O tio rico que apareceu de repente e ofereceu para pagar escola de grã-fino. O
pai aceitou na hora. No início até gostei, imagina pagar de Patricinha? Curti.
Fui
para escola, mas não pensei que estudava tanto. Chamaram meu tio dizendo que eu
não estava acompanhando a turma. Meu tio era tão bonzinho. Explicou que de onde
eu vinha era tudo muito difícil, elas tinham que ter paciência comigo. Falou
que ia pagar professora particular para me ajudar a avançar nos estudos. Ele
pagou mesmo e eu acabava com a moça. Dava até pena porque ela fazia de tudo
para conservar as aulas que rendiam um bom dinheiro e eu ainda atrapalhava a
menina. Hoje eu sei de tudo isso e me arrependo, coitada.
Já
estava cansada de tanto estudo e passei a ser a revoltada da escola. A diretora
não aguentava mais e chamou o tio de novo. Desta vez, ele falou com a mãe que
me conhecia muito bem e disse que eu não ia só estudar se continuasse assim, eu
ia trabalhar e voltaria para escola antiga.
Não
liguei, falei uns desaforos para a diretora e depois de quebrar tudo fui
expulsa. O tio ficou tão decepcionado que foi embora e não quis mais me ver,
não pagou mais curso nenhum e a mãe constrangida me colocou para trabalhar no
mercado. Ainda assim, eu não rendi, arrumei namorado e larguei a escola sem a
mãe saber. Depois falaram para ela. Minha mãe disse que se era esta a vida que
eu queria deveria sair da casa dela. O que? Me expulsar? Não precisava me
expulsar não. Eu fui embora e estava morando num quartinho. O dinheiro do
trabalho nem pagava o aluguel direito. Depois disso, foi questão de dias para
ter uma perseguição e eu levar um tiro que me trouxe para cá.
Agora
eu entendi tudo. Sei que fui uma boba. Recusei a boa oportunidade que tive.
Poderia ter sido diferente e, quem sabe, eu poderia até ter voltado jubilosa
por ter cumprido minha tarefa, passado na prova, mas não. Não deu certo, agora
vou ter que refazer. Bem feito.
LUCIANA
25/02/18
----------------Paula
Alves--------------------
“ERREI TAMBÉM E AINDA TIVE QUE PAGAR
PELO ERRO”
A
Janete roubou, eu vi. Nós sempre fomos amigas, mas roubo. Não aceito não.
Aproveitou que a menina tinha ido ao banheiro e mexeu na bolsa dela. Moça
bonita, toda arrumada, nem parecia que precisava trabalhar. A gente, nossa
quanta diferença. Pobres, metidas a besta, mas nem onde cair morta. Trabalhando
numa loja no shopping e a moça chegou com a maior educação perguntando se tinha
alguma oportunidade para ela. A dona da loja conversou um pouco e logo já
estava contratada.
Até
parece que não deu curiosidade de saber quem ela era, muito fina para trabalhar
na loja. Ela foi ao banheiro e a Janete mexeu na bolsa, nossa quanta grana.
Cartão de crédito, maquiagem cara. Não entendemos nada. A Janete pegou a
carteira da menina e só iria devolver no outro dia. Arrebentou de consumir no
cartão da moça. Comprou tanto. Eu fiquei com aquilo na cabeça. Não era certo,
mas eu ia entregar minha amiga? Não podia né?
E
ainda comprou uma blusinha para mim, eu falei que tinha que devolver o cartão.
No outro dia, a dona da loja estava esperando a gente, na hora cobrou o
desaparecimento da carteira da menina. Falou que só podia ser uma de nós duas,
que a menina estava indignada com a falta de comprometimento da gente porque a
gente podia roubar qualquer um. A Janete toda dissimulada ficou com cara de
revolta e disse que era um absurdo falar que foi ela. Disse que ela era séria e
nunca havia roubado ninguém. Falou que se quisessem podiam até revistar a nossa
bolsa, eu estranhei. Na bolsa da Janete não tinha nada mesmo, eu fiquei
pensando “onde será que ela colocou a carteira?”
Me
surpreendi muito quando a carteira foi encontrada na minha bolsa. Eu fui presa
e demorou até minha mãe conseguir me tirar de lá. Pobre, sem pai. Eu nunca
aceitei esta traição. Eu gostava dela e considerava a Janete minha melhor
amiga. É muito triste a expectativa que a gente coloca nas pessoas e quando
leva estes golpes parece até uma facada na nossa alma. Eu gostava dela e sentia
que a gente tinha uma parceria por nossa condição difícil. Nada disso, ela fez
a coisa errada e eu errei porque não falei para ela, eu acobertei. Errei também
e ainda tive que pagar pelo erro.
MELISSA
25/02/18
Nenhum comentário:
Postar um comentário