“DESPREZO É
PIOR QUE TUDO PORQUE É O FIM, É A NULIDEZ DO SENTIR”
A vida realmente parecia não ter nenhum sentido.
Minha esposa era tudo para mim. Eu me sentia amado e acreditei que pudéssemos
formar uma linda família. Eu fazia tudo para agradá-la e quando ela disse que
ia embora, meu mundo desabou. Me senti um fracassado. Eu questionei se ela
tinha outra pessoa e ela respondeu que eu não percebi que o fim estava se
aproximando. Eu não notei nada errado no nosso casamento, para mim, estávamos
bem, mas ela disse que não me amava como antes e não queria estragar sua vida
num relacionamento baseado em aparências. Quando dei por mim, as malas já
estavam prontas. Ela não esperou minha posição, não quis me ouvir, bateu a
porta e sumiu.
Não tenho vergonha de dizer o quanto chorei,
quebrei alguns móveis, me senti bobo, omisso, depois a culpei, desejei matá-la.
Compreendi muitas coisas depois dos sentimentos que brotaram dentro de mim.
Ninguém quer ser desprezado. Desprezo é pior que tudo porque é o fim, é a
nulidez do sentir. Ela não tinha nada para me oferecer e eu queria lhe oferecer
o mundo inteiro.
Me preocupei com o que as pessoas diriam, me
preocupei comigo e só comigo, eu sofri demais. Minha cabeça fervia e eu peguei
o carro e sai doido. Então, tive um pequeno acidente de trânsito, no qual o
outro motorista percebeu a minha cegueira. Eu não quis discutir, disse apenas,
que o erro havia sido meu, como tantos outros, mas em breve o mundo estaria
livre de mim.
Ele arregalou os olhos e falou que eu
precisava conversar, me pediu para parar o carro ali por perto e tomar uma água
para acalmar os ânimos. Aquele homem foi enviado por Deus. Ele não disse nada,
mas me ouviu por mais de três horas. Ele só me ouviu. Eu falei coisas que
estavam bem guardadas no meu peito. Confessei todo amor que sentia por Marília,
toda a decepção que eu senti e que não queria mais fazer parte daquele mundo
terrível, então, ele respeitou todo meu transtorno e me deixou falar, ser
vítima, ser cruel com ela, comigo. Depois que conclui minha história, ele me
agradeceu. Disse que estava separado há duas semanas e que estava se
acostumando com a vida sem sua esposa. Ele contou que tinha filhos e que a vida
sempre nos dá chances que devemos agarrar e sermos gratos por elas. Ele falou
coisas importantes sobre esperança e fé.
Aquele homem me salvou da morte porque me deu
atenção. Ele me deu o número de seu telefone e falou que eu deveria ligar
sempre que estivesse com o pensamento revoltado demais para acreditar que a
vida é algo maravilhoso. Eu liguei várias vezes e nos tornamos bons amigos.
Tanto que, dois meses depois, eu conheci uma mulher fantástica que se tornou
minha esposa após alguns anos. Esta mulher formou uma grande família comigo e o
homem que me salvou – Francisco, foi o melhor amigo que tive nesta encarnação.
Eu descobri anos depois, chegando aqui, que Francisco conseguiu resgatar um
débito enorme comigo porque em outras existências ele havia tirado minha vida
num assalto.
É muito lindo ver o quanto as vidas se
entrosam. Saber o quanto estamos todos unidos pelos planos de Deus. Eu quase me
suicidei, mas o homem que passou no meu caminho, como que por acaso, me salvou
do crime e, ainda por cima, resgatou débitos anteriores só de me dar atenção.
Eu sou extremamente grato.
RUBENS
28/09/19
-----------------------------------------Paula
Alves-------------------------------------
“ACHO QUE A GENTE SEMPRE
PODE AJUDAR AS PESSOAS, SE TIVER VONTADE DE AJUDAR E TAMBÉM TIVER AMOR NO
CORAÇÃO”
A percepção das coisas me confundia como se
eu não soubesse que dia é hoje. Parecia um mundo a parte, uma deliberação do
meu eu que insistia em facilitar as coisas. Eu não queria estar ali. Eu sempre
fui invisível. Tomada de sobressalto ela apareceu e falou que estaria ali se eu
quisesse conversar, mas eu não pensei que ela se importasse.
Em casa éramos muitos, doze filhos para uma
mãe cansada, cheia de afazeres. Eu era a filha mais velha e estava sempre
exausta porque tinha que ajudar a cuidar dos menores, tinha que ajudar em tudo.
Sentia pena de minha mãe, mas eu não podia ser responsável pelos erros dela, eu
estava exausta. Queria tanto descansar, dormir sem ter hora para acordar, sumir
era o que eu queria. Eu não era egoísta, não tinha tempo para cuidar de mim ou
para pensar no dia de amanhã porque ele sempre chegava tão rápido e eu tinha
tanto a fazer.
Mas, naquele dia, a professora me viu, Odete.
Ela me viu e se preocupou comigo. Disse que estaria ali se eu precisasse dela.
Eu estive avoada por tanto tempo, não sabia o que ela estava dizendo na aula,
eu estava com sono. Estava pensando que seria, apenas um momento simples de ser
passado porque era só dormir. Eu já tinha planejado tudo. Os remédios, tinha
conseguido na casa da vizinha, com a filha da vizinha que me encorajou, ela
falou que eu devia acabar com tudo mesmo porque minha vida era muito ruim.
Menina má, nem por um instante, tentou tirar da minha cabeça a ideia de morte.
Eu estava cansada demais e a professora percebeu alguma coisa que eu pensei
esconder para o mundo todo. Eu quis conversar antes de ter meu fim e foi aí que
ela me chamou para tomar um lanche, eu gostei muito. Ela falou bastante porque
eu estava silenciosa, temi o que ela poderia pensar se eu fosse sincera e
contasse que tinha remédios para morrer.
Ela foi astuta, falou de outras pessoas,
amigas dela que passavam por momentos difíceis e achavam que a morte resolvia
tudo. Ela me falou que a morte não existe e que o fim é só o da carne, sofre
muito quem comete suicídio. Não pode, é crime contra a própria vida. Ela falava
como se estivesse contando o que aconteceu com outra pessoa, mas eu ouvi tudo e
temi. Ela falou que a gente é sempre importante para alguém. Sempre tem quem
ama a gente mais do que tudo no mundo. Sempre tem quem vai sofrer demais porque
quer a nossa felicidade. Ela falou de coragem. Que a vida é difícil mesmo, à
medida que vamos nos tornando adultos, as coisas vão ficando bem sérias e
complicadas, mas sempre tem solução para tudo. A gente tem que ter coragem,
perseverança e fé que tudo vai dar certo.
Eu ouvi tudinho e comecei a ficar
envergonhada porque sabia que a minha mãe me amava demais e precisava muito de
mim. Eu não podia abandoná-la e ainda dar desgosto para ela. Aí, tomei coragem
e falei do remédio, a professora me abraçou tão forte. Ela chorou de verdade e
me pediu para tirar a ideia da cabeça. Ela se importava mesmo comigo, com todos
os alunos. Sei que ela teria feito isso por qualquer um, ela era boa demais.
Eu chorei e prometi que jogaria os remédios.
Ela marcou de conversar comigo no outro dia, como um compromisso que eu deveria
cumprir. Disse que iria me ajudar e, foi assim, que eu consegui apoio
psicológico. Minha mãe foi chamada na escola, a professora com toda delicadeza
explicou para ela e nós conseguimos superar minha quase tentativa de suicídio.
Graças a Deus que dona Odete percebeu meu jeito, meu olhar distante, minha
tristeza. Acho que a gente sempre pode ajudar as pessoas, se tiver vontade de
ajudar e também tiver amor no coração. Grata.
CECÍLIA
28/09/19
---------------------------Paula Alves-------------------
“EU PRECISEI
DESPERTAR PARA FÉ PARA CONTINUAR VIVENDO”
Ninguém podia notar. Eu sorria e era educada.
Tinha uma vida socioeconômica estável, tinha estudo, carreira, mas haviam
sentimentos que eu não podia explicar. Uma sensação desagradável que me proibia
de me entregar inteiramente a um homem como eu desejava. Eu estava sempre
inquieta, insegura. Ora pensava de um jeito, ora de outro. Eram pensamentos
confusos como se não fossem meus, me dizendo que as pessoas não gostavam de mim
e que aquela vida era uma bobagem. Até onde eu chegaria com a vida indiferente
que eu tinha? Eu nunca teria um relacionamento sério porque os homens não me
levavam a sério, eu nunca seria mãe. E era tudo o que eu queria, uma família,
um lar.
Chegava em casa e não tinha ninguém a me
esperar. Minhas amigas já estavam casadas e o tempo passando para mim, me
certificando que nunca teria o que almejava e eu já não tinha paciência para
procurar por alguém, estava envelhecendo sozinha.
Sozinha?
As vozes na minha mente me mostravam cenas
onde eu ficaria doente e só, passando por dificuldades e só, então, me
conduziram a acreditar que era melhor morrer, enquanto tinha forças para me
matar. Eu não chegaria a este pensamento sozinha, mas naquela época, eu não
tinha informações contundentes sobre influências espirituais.
Eu passei por uma igreja a caminho do
trabalho e um obreiro me parou preocupado, me pediu para lhe dar um instante do
meu tempo e inexplicavelmente, ele disse o que eu estava pensando fazer. Ele
falou que o Senhor não se alegrava com minha intenção. Disse que o Senhor tinha
planejado uma vida linda para mim, mas eu precisava ser forte e não dar
oportunidade para o inimigo me destruir. Eu estava compreendendo o que ele
dizia, não fazia muito sentido, mas eu sentia que era verdade. Eu chorei quando
ele falou que, se eu me entregasse aos pensamentos destrutivos, estaria abrindo
mão da família que eu almejava porque o homem preparado para mim estava prestes
a cruzar meu caminho. Ele orou por mim e pediu que eu fosse firme na fé.
Eu orei como nunca, pedi forças a Deus e
dormi tão bem naquela noite que desejei isso para sempre, aquela sensação de
bem estar, de paz, por isso, voltei à igreja muitas vezes, como fiel, depois me
tornei trabalhadora ativa e, foi lá mesmo, que conheci Leandro que se tornou
meu esposo e me deu três filhos abençoados.
Minha vida foi salva por um irmão que me observou quando
eu caminhava na rua e viu, com os olhos espirituais, aquele que foi meu
obsessor. O irmão Clodoaldo era médium. Devo muito a ele.
Chegando aqui, depois de minha vida
maravilhosa, soube que alguém insistiu para que eu me suicidasse. Este obsessor
estava empenhado em me castigar e falava nos meus ouvidos palavras de
encorajamento que me levassem ao ato cruel.
Graças a Deus fui conduzida à benção e, por todas as
preces fervorosas, pelo caminho reto que eu me propus seguir, ele não pode mais
ficar ao meu lado porque eu o repeli.
Devemos compreender que as pessoas não podem
nos ferir, nem os Espíritos. Só quem pode nos ferir somos nós mesmos quando
cometemos erros e acionamos a Lei do reajuste necessário. Eu me modifiquei em
nome de Jesus. Eu vibrei diferente por causa da oração e da fé que despertou em
mim uma mulher cheia de ânimo e coragem para enfrentar a vida que Deus queria
para mim. Eu precisei despertar para fé para continuar vivendo.
Quem tiver olhos para ver que veja a situação triste de
muitas pessoas e possa salvar vidas como o irmão Clodoaldo. Deus os abençoe.
ISADORA
28/09/19
--------------------------Paula
Alves----------------------
“ELAS ME SALVARAM DO
ABUSO E DO CRIME”
Eu tentei sim. Tomei tanto veneno que achei
que meu corpo não fosse suportar. Não aguentava mais aquele horror. Não tinha
mais nada que pudesse me livrar daquele homem nojento. Ele me molestava desde
os doze anos. Minha mãe nunca desconfiou. Quando eu tentava falar, ele me
judiava e dizia que me mataria. Eu ouvia coisas terríveis, cruéis. Não tinha
esperança para mim, aos quinze engravidei do marido da minha mãe e ele comprou
remédios me fazendo abortar. Ela nem sonhava que tinha um crápula dentro de
casa.
Aí, eu não pensei duas vezes, tomei
chumbinho. Mas, minha mãe me achou logo em seguida e saiu correndo comigo nos
braços, vomitando, quase desfalecida. Ela ficou desesperada e o marido dela
também. Fui muito bem tratada no hospital, as enfermeiras perceberam que eu
sofria maus tratos por causa da minha aversão pelos enfermeiros. Conversaram
com a assistente social, ela falou comigo, mas eu não confessei nada, não dei
certeza, aí ela falou de exame, disse que não podia me liberar porque temia que
eu tentasse suicídio novamente e, desta vez, desse certo. Ela não queria ser
responsável pela minha morte e eu não entendi o que ela dizia. Ela falou que,
quando alguém ignora uma coisa destas, é o mesmo que colocar a arma na mão da
pessoa, é crime da mesma forma.
Ela não podia ser conivente, ela não ia
permitir. Então, ela falou bastante sobre ajuda. Disse que sempre tem um jeito
de mudar as coisas, de modificar a vida para melhor. Eu já estava podendo
pensar em futuro sem abuso. Eu aceitei a ajuda dela. Ela contou para minha mãe
que chorou e disse que mataria meu padrasto, mas a assistente chamou a polícia
e ele foi preso.
Eu nunca imaginei que uma conversa pudesse
resolver tanta coisa. Eu não pensei que as pessoas pudessem corrigir a vida da
gente. Mas, encontrei muita gente boa naquele hospital. Eu vi minha mãe
transtornada. Ela não sabia o que dizer para me pedir perdão. Nunca desejei que
ela sofresse daquele jeito. Ela sentiu como se estivesse me entregando em
sacrifício para aquele marginal. Foi difícil conduzir a vida depois de tudo o
que vivemos. Eu e minha mãe fomos marcadas pela violência doméstica, pelo
abuso, pelo trauma.
Não desejo para ninguém porque não tem como
esquecer. Até hoje doutor não sai da minha cabeça as torturas que vivi. Eu não
consegui me relacionar com ninguém. Já sei que expiei erros graves do passado,
mas ainda assim, é tudo muito doloroso. Resgatei e graças a Deus não adquiri
mais débitos com o suicídio que não cometi porque minha mãe chegou em casa na
hora certa. Se aquelas mulheres do hospital não tivessem feito um pouco além do
seu trabalho, eu sei que teria tentado de novo, por isso, peço a Deus que as
abençoe por terem me dado novas perspectivas de vida. Elas me salvaram do abuso
e do crime.
SEVERINA
28/09/19
---------------------------------Paula Alves---------------------------------
“EM TODO ATO CIRÚRGICO
EXISTEM RISCOS”
A vida era boa, mas eu sempre estava
descontente. Faltava mais, sempre mais.
Meu esposo dizia que eu era linda. Ele me
olhava com amor e tratava com tanta delicadeza. Me lembrando de tudo que vivi
sei que devia ter dado mais atenção às coisas boas, aos momentos mágicos que
recebi como presentes de Deus.
Naquele momento, eu não despertei para os
dias especiais, para os meus afetos que, posteriormente, haveria de sentir
tanta falta, eu apenas me olhava no espelho e via imperfeições.
Eu desejava ficar satisfeita com meu aspecto, colocar uma
roupa e sair poderosa, sem constrangimento por conta da silhueta distorcida
pelo tempo.
Eu merecia me sentir bonita, então, procurei
meios estéticos que me trouxessem o bem estar que almejava.
“Em todo ato cirúrgico existem riscos” - dizia o médico,
porém, ele me afirmou que eram mínimos, não havia com o que se preocupar. Por
isso, investi uma soma em dinheiro e fiquei contente, achando que ficaria
melhor e mais bonita.
Fui para a cirurgia, me senti tão mal, foi
como se estivesse tendo um pressentimento, temi. No último instante, desejei
desistir, mas logo me sedaram. Então, quando acordei profundamente entorpecida,
meu corpo sangrava, fiquei desesperada com os cortes, com o estado em que eu
estava.
O delírio, o desespero, a ilusão de estar
sozinha naquele hospital gigante, tudo isso foi um pesadelo. Não sei quanto
tempo demorou.
Acho que muito tempo depois, cansada, arrependida. Eu
queria voltar no tempo. Queria meu corpo como era: imperfeito e cheio de saúde,
motivação e vida.
Compreendo que, os vinte anos que passei
nequele torpor, naquele delírio foram necessários para que eu tivesse respeito
pela vida.
O suicídio sempre ocorre quando antecipamos a morte, não
importa de que forma seja porque está associado a falta de cuidado, negligência
com o corpo e com os órgãos vitais.
Nunca imaginei que poderia estar me
suicidando, mas muitos diziam que a cirurgia poderia ter complicações, mesmo
assim, eu paguei para ver, eu preferi arriscar a própria vida pela vaidade.
Arrisquei e perdi. Talvez, se tivesse esta informação, teria deixado para lá.
Minha vida era tão boa. A prova veio e eu fracassei de novo
EMÍLIA
21/09/19
--------------------------------Paula
Alves--------------------------------------
“É FÁCIL APONTAR
FUMANTE, MAS TEM SUICIDA EM TODA PARTE”
Eu fui apontado, criticado e ridicularizado.
Cheguei no vale sem conseguir respirar. Sabe lá o que é tentar puxar o fôlego e
nada?
Terrível cara! Parece que você tá no meio de
um incêndio e não tem como respirar. De alguma forma, eu lembrei do ventilador
mecânico. É muito estranho porque os médicos fazem de tudo para deixar
confortável, aumentam a sedação e, mesmo assim, eu registrei. Eu senti o
desespero do meu corpo lutando pela vida, mas, após 50 anos de tanta fumaça,
não tinha jeito. Já estava tudo destruído. Pulmões duros, sem elasticidade
nenhuma, imagina pra puxar o ar. Era uma Tortura.
E eu caminhava no vale tentando respirar,
lembrando as tragadas, a moto, as loiras que curtiram comigo. Aí perdia o fôlego
e rastejava no pântano, no brejo. Sei lá quanto tempo...Sei lá.
Sei que, cheguei aqui, depois que a equipe
apareceu como pequenas estrelas para iluminar aquele horror. Eu chorei. Pedi
por socorro, eu queria ar. Eles se aproximaram e eu quase temi. Vim, fui
cuidado e ainda faço terapia para respirar, para condicionar a mente com a
saúde do perispírito.
Penso tanto no mal que a gente faz para nós mesmos todos
os dias. É fácil apontar fumante, mas tem suicida em toda parte.
Eu vi no vale, tinha quem comeu demais, quem
se preocupou tanto que gerou toxina e agravou o cérebro, quem se auto medicou,
quem não se medicou ou não fez o tratamento que devia, quem bebeu, quem se
drogou de todo tipo. Enfim, todo mundo que morreu antes da hora por
imprudência, por descaso ou descuido. Enfim, todo mundo que se tratou de
qualquer jeito estava lá sofrendo para valorizar a própria vida que é
oportunidade que deve ser honrada.
Deve ser, por isso, que Jesus falou: “amar ao
próximo como a si mesmo”.
A gente acha que se ama com vaidade, se
achando sempre o melhor, superior, com orgulho. Isso não é amor não, isso é
estar fora da realidade.
Ter os pés no chão e saber valorizar o que é realmente
importante. Se cuidar com desvelo e respeito para conservar a saúde e viver
todo tempo que Deus achar necessário.
ALEMÃO
21/09/19
-----------------------------------Paula
Alves----------------------------------
“FIQUEM DE OLHOS ABERTOS”
Não tinha dia melhor, nem palavra de consolo. Eu até tentei desabafar,
mas eu tive a impressão de que as pessoas se incomodavam com minha presença. Eu
não queria ser um peso para ninguém. Aquele que diz: “Por que você se sente
mal? Você tem tudo na vida. Tem saúde, casa, família. Não tem motivo para
tristeza!”
Este não é um bom amigo para desabafar.
Eu pensava que ninguém nunca entendia o que eu estava sentindo e as
lágrimas não estavam aliviando minha sensação de inutilidade. Uma certeza de
que o mundo não caminha para o progresso, que as pessoas só pensam em si
mesmas, tamanha hipocrisia, indiferença, deslealdade. Eu temi que só eu
estivesse vendo tanto desprezo, tanta ruina. Entrei
no quarto, apaguei a luz, me cobri até a cabeça e desejei que os pensamentos se
calassem. Eu nunca tive ninguém para se preocupar comigo. Mas, eu já não queria
sentir tanta solidão e pensei: “Para que viver? Para que tanto estudo do que eu
nunca vou usar? Para que tentar um emprego que nunca vai me trazer estabilidade
e pra quê ficar competindo com todo mundo?
Da casa maior, do carro melhor, do namorado mais bonito. Eu nem queria uma aliança, eu só queria paz, mas nunca soube onde
deveria procurá-la. Seria melhor acabar, melhor desaparecer.
Pensei nos meus pais, nos meus irmãos, mas
seria, apenas um momento difícil. Eles teriam um problema para solucionar e, após
o sepultamento, tudo voltaria ao normal sem o peso de pensar como seria o meu
futuro. Eu acreditei que estava facilitando para eles. Na certeza de que tudo
seria extinto tomei a medicação da mamãe. Tudo de uma vez para não ter volta.
Fiquei zonza e pensei que seria um fim leve,
quase um desmaio que pudesse apagar minha consciência.
Porém, fui violentamente arremessada contra a parede. Vi o
corpo jogado no chão e desesperei, tentei voltar, me acordar. Corri pela casa,
falei com todos, pedi ajuda em vão.
Foi horrível, horrível!
Eles sofreram, eu sofri. Me arrependi tanto, tanto.
Não pensei que a vida é eterna e o corpo tão valioso instrumento de elevação. Se
eu soubesse, teria me esforçado para falar que eu precisava de ajuda.
Deve haver muitos como eu espalhados por aí. Muitos
pensando no fim.
Fiquem de olhos abertos.
SOFIA
21/09/19
-----------------------------------------Paula
Alves---------------------------------------
“ENTENDI O
QUANTO FUI DESCUIDADA COMIGO”
Tava trabalhando rapaz. Vida de mulher
trabalhadeira. Acordar às 4 da manhã, se arrumar correndo e pegar no batente. Guerreira,
sempre enfrentei temores para levar o dinheiro para casa, para sustentar meus
filhos que estavam crescido começando com o estudo sério. Eu sonhava com o
filho doutor que tivesse a vida melhor que a minha. Sonhei por melhores
condições para aqueles meninos.
E nunca tive vergonha do meu trabalho,
faxina. Fazia com gosto, com maior esforço. Nada de fazer de qualquer jeito,
enganando patroa não. Fingir que lava banheiro, passar paninho. Eu trabalhava
duro era para ser elogiada, uma indica para outra; Não faltava serviço. Mas o
problema era a vidraça. Nos apartamentos, janela grande é um assombro. A gente
faz peripécia para agradar patroa. Nem percebi o escorregão. Eu estava tão
acostumada. Trabalhei naquela casa mais de 10 anos, patroa ótima, fazia agrado
e tudo. Eu limpava com esmero. Escorreguei e cai, uma, duas, quinze, trinta,
mais de 50 vezes caindo. Não tinha fim. Era um dia longo de faxina que acabava
com a queda e antes de bater no chão, começava tudo de novo.
Entendi o quanto fui descuidada comigo. Não
podia agir assim, claro que ia cair mesmo. Até que eu percebi, quis mudar, mas
não tinha como, subi para limpar a vidraça chorando e quando escorreguei alguém
segurou minha mão e me tirou de lá. Cheguei aqui tão aliviada. Não estava
gostando nenhum pouco daquela vida horrorosa.
Flávio – meu protetor – explicou tudo. Eu
voltei antes, bastante tempo antes, por isso cai tantas vezes.
Foi suicídio pode? Nunca pensei em me matar. Mas
a intenção aí foi de não me cuidar. Quanto intencional de me arriscar pelo
dinheiro, pelo trabalho. A vida deve ser objetivo principal porque, com ela,
vivenciamos tudo que é essencial para crescer em virtude e intelecto, evoluir.
Agora eu entendi.
LUCRÉCIA
21/09/19
----------------------------------------Paula Alves------------------------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“TODO MUNDO DEVIA SE
PREOCUPAR COM A EDUCAÇÃO PORQUE MUITAS COISAS PODIAM SER EVITADAS”
Eu nem sabia atirar. Me chamavam de marginal. Você acha que eu gostava
de ser apontado na rua? Cara de pobre, todo desajeitado, cheio de gíria. A
gente tenta ser igual a maioria, mas não se encaixa e é tachado, é apontado,
discriminado. Não tinha juízo não.
A verdade é que as pessoas são cheias de um falso moralismo. É bem fácil
falar bonito e dizer que isso não pode, aquilo não deve, mas sente. Sente no fundo
do peito e com sentimento não se brinca cara. Eu sentia raiva de ser
maltratado, aí o professor chegou dizendo que eu não podia levar tudo tão a
sério, eu não podia levar em consideração. Ele me perguntou muitas vezes, se eu
não sabia quem eu era de verdade, disse que isso já bastava, mas não é assim.
Todo mundo quer ser aceito, fazer parte do bando é o que todos querem. Aí você
se revolta e quando vê tem outro doido igual a você que pensa as mesmas coisas,
que sente tudo parecido com a mesma revolta. Eu só queria dar um susto, mostrar
que eu merecia respeito nem que fosse para causar pânico. Cara, é tudo
inconsequente!
A gente nem percebe que está ouvindo coisas. É uma força estranha que
vai surgindo e plantando coisas na sua cabeça. Nunca que eu poderia imaginar
que este negócio de Espíritos existia mesmo. Eles me influenciavam, mas eu
estava cheio de vontade de barbarizar como eles me sopravam nos ouvidos. Meu
amigo do mal, o rapaz que também estava com sangue nos olhos, estava pior que
eu. Te garanto que chega um momento que não tem mais volta, a gente planeja e
almeja acabar com tudo, detonar geral. O fato é que acabou mal só para mim.
Hoje eu percebo que foi melhor eu ter sofrido tudo sozinho. Quando eu passei
naquela blitz e os caras me viram armado, não deu outra, fiquei todo
atrapalhado e quando tentei tirar a arma para entregar, eles me fuzilaram.
Foi uma dor estranha, bateu junto com o arrependimento. Veio umas
imagens que nunca iriam acontecer. Eu sabia que era coisa do futuro porque
apareceu uma mulher muito bonita, depois, eu me casei com ela e tive uns quatro
garotinhos, como se a vida estivesse me mostrando tudo o que eu estava perdendo
por causa daquelas tolices.
Morri, vaguei e fiquei sentindo aquela dor por muito tempo. Uma dor no
peito, no local da bala. Eu até tentei tirar, mas ela estava grudada em mim.
De repente, vi aquela mulher que era tão bonita, mas ela me abraçou e
disse que a gente já podia conversar em outro local. Eu já estava refletindo de
outra forma, também tinha passado trinta anos. Coisa feia!
Quando cheguei aqui, descobri que aquela mulher tinha sido minha mãe em
outra vida e ela se culpava por coisas que não tinha me ensinado. Ela achava
que eu estava sofrendo por causa da negligência dela em outra existência. Nem
sabia que mãe ultrapassava o tempo e o espaço. Ela conversou muito comigo,
falamos sobre ética, sobre respeito, sobre a humanidade e a vida que deve ser
respeitada de forma integral, a minha e a dos outros também. Ela falou que não
podia permitir que eu me perdesse de novo e perguntou se eu poderia aceitar que
ela me tivesse como filho. Eu gostei muito dela e disse que aceitava. Eu não
sabia muito do que ela estava falando. Acho que falta um pouco de virtude, um
pouco de indulgência. Sei lá, não precisava ter sido ruim, mas poderia ter sido
péssimo, se eu tivesse feito o que planejei.
Todo mundo devia se preocupar com a educação porque muitas coisas podiam
ser evitadas. Aprender a ter amor pela vida e pelas outras pessoas. Eu não
sabia...
VAGNER
14/09/19
--------------------------------------------Paula
Alves----------------------------------------
UM ERRO NÃO PODE
JUSTIFICAR OUTRO”
Tava lá, todo mundo com fome. O doido do meu pai bebia tanto que chegava
a cair pelas ruas. A mãe, coitada, nem sabia o que fazer pra alimentar tanta
gente. Eu não queria ser ladrão, mas jovem arranja dinheiro pra fazer compra de
mês? Ou vai vender drogas ou, então, vai ser ladrão. Eu nem tinha outra coisa
pra pensar. Um desespero danado quando a fome aperta.
Tem gente que aponta. Todo mundo fala mal, mas fazer caridade de verdade
é pra poucos. Muitos são mal intencionados com o pobre. Fala de caridade e
ainda quer lucrar de alguma forma, igual político. O fato é que é duro ver
aquele monte de criança querendo comer e não ter nada pra colocar na panela,
nem pensei duas vezes. Peguei a arma de brinquedo e saí sem a mãe perceber. Da
primeira vez foi fácil. Eu tremi de medo, mas consegui pegar um dinheiro no
armazém. Cheguei em casa com comida e a mãe quando viu fechou a cara. Ela pegou
no meu braço com força, os olhos encheram de lágrimas, mas a garotada viu o pão
e avançou no pacote. Minha mãe correu pra acudir a meninada com fome e balançou
a cabeça em negativo me repreendendo. Ela sabia que eu não tinha como comprar
tudo aquilo.
Depois fiz de novo e minha mãe tinha medo de perguntar como vinha aquela
comida, ela chorava escondido. Eu sempre tive medo, acho que me acomodei. Nada
justifica um ato errado. A verdade é que todo mundo tem uma prova para passar.
Quando a gente se acovarda, quando se acomoda é cem por cento de chance de
fracasso meu amigo. Aconteceu comigo. O melhor seria lutar, pegar uma enxada,
catar latinha, sei lá. Acho que, se a gente procura, deve achar alguma coisa
porque Deus deve abençoar. Não tem aquele ditado que “Ele abençoa quem cedo
madruga”? E eu acordando meio dia, ia conseguir o quê?
Aí teve um dia que me dei mal. Levei a arma de brinquedo e achei uma de
verdade, sendo apontado para minhas fuças. Tomei bala amigo. Morri!
É triste perder uma vida, sabe igual no vídeo game? Não dá para voltar
atrás. Quem for esperto que se dedique o máximo que puder para andar na linha.
Isso porque vai ter um dia que esta pessoa vem para o lado de cá e vai poder
ficar em paz com sua consciência. Quem faz tudo certinho pode não ter muito
dinheiro, nem ser reconhecido, pode estar sempre cansado ou doente, mas ter paz
na consciência é felicidade.
Eu vim totalmente atormentado, assustado. Eu enfrentei a vida dando uma
de corajoso e fui o maior covarde porque não enfrentei minha prova de miséria.
Tinha tudo para conseguir emprego porque eu tinha bastante coisa: saúde, minha
mãe para me apoiar, tinha muito potencial e não fiz o que devia. Até podia
culpar meu pai, mas coitado, também teve vida difícil. Um erro não pode
justificar outro.
JOSH
14/09/19
----------------------------------------------Paula
Alves--------------------------------
“O QUANTO É IMPORTANTE A
FIDELIDADE, A LEALDADE, MAS TAMBÉM O PERDÃO NO LAR”
Ninguém nasce e passa a vida tentando cometer um crime. Eu fui feliz e
tive muitas coisas boas. Tinha família, amigos, um bom emprego, um lar. Eu me
sentia especial e parecia que nada mais me faltava. Até o dia em que soube da
traição do meu marido. Meu mundo ruiu porque eu não imaginei, então, me senti
enganada, iludida e ofendida. Uma dor profunda tomou conta do meu ser, como se
eu vivesse uma vida de mentiras. Esperei meus filhos dormirem e quando o Osmar
chegou em casa, eu estava aguardando para uma conversa definitiva. Confesso
que, enquanto eu esperava por ele, me passaram os piores pensamentos. Coisas
terríveis tomaram conta de mim e eu senti como se tivesse me transformado.
Osmar percebeu que eu estava transtornada. Eu fui direto ao assunto e ele me
pediu perdão, pediu para que eu reconsiderasse nossa vida e nosso casamento.
Ele falou de lealdade e do defeito do homem achar que pode ter relacionamento
fora do lar. Ele me amava e queria reconstituir nossa vida de casal, passaria
por cima de tudo e nunca mais teria relacionamento extraconjugal.
Eu ouvi tudo pacientemente e imaginei meu esposo com a outra. Meu olhar
não tinha lágrimas, tinha fel. Eu peguei a arma e apontei para ele. Eu não
julguei, não projetei nosso futuro ou o das crianças. Eu só sentia a fúria. Eu
podia ter atirado. Senti como se uma mão segurasse a arma junto comigo. Mas,
uma coisa incrível aconteceu. Eu vi minha mãe perto do Osmar e ela tinha um
olhar suplicante como se me pedisse para não cometer aquele desatino. Minha mãe
estava falecida há quinze anos. Eu soltei a arma e arrumei as malas do Osmar.
Naquele dia, ele partiu e eu comecei a estudar a vida após a morte. Nunca
tinha me dado conta do quanto a espiritualidade intercede a nosso favor. Foi
tão forte aquela visão que até deixei de lado a traição do Osmar, mas coloquei
ele para fora. A verdade é que eu compreendi muitas coisas que me fizeram
chegar até aqui muito mais lúcida e pacificada. Eu nem tenho palavras para
agradecer minha mãe pelo que fez, sim, foi ela. Acreditem que todos tentam nos
conduzir no bom caminho, sempre!
O Osmar me magoou muito. Eu refleti que não estamos prontos para perder.
Para perder nada. Nós não podemos perder o emprego, a casa, os filhos para suas
futuras esposas, o carro numa enchente e nem perder o marido para uma mulher
mais jovem, mais bela ou mais inteligente. Nós não estamos preparados para
perder nem a vida no corpo. Eu refleti tanto. Amava o Osmar, mas meu orgulho, o
medo do que as pessoas poderiam dizer e a insegurança de uma nova traição,
poderiam permitir que o Osmar voltasse para casa, mas eu queria meu marido
comigo. Eu queria meu marido me ajudando a cuidar dos nossos filhos. Eu queria.
Então, enquanto ele estava em outro local me pedindo para recebê-lo novamente
em nossa casa, eu li, eu estudei e achei que o perdão era o meu maior aliado.
Eu podia me esforçar para perdoar e reconstruir meu casamento porque era o que
eu queria.
Após seis meses de angústias, eu o convidei para jantar conosco e não
consegui suportar a distância porque eu o amava. Eu não me arrependo do que
fiz. Tivemos uma vida linda. Nunca me esqueci de tudo o que vivemos e sempre
tentei ensinar meus filhos como uma mulher precisa ser bem tratada. O quanto é
importante a fidelidade, a lealdade, mas também o perdão no lar porque isso
pode acontecer com qualquer um. Agradeço muito a espiritualidade que usou de
tanta bondade para que eu não cometesse um crime no meu próprio lar. SUELI
14/09/19
------------------------Paula Alves-----------------
“QUANDO É QUE EU IA IMAGINAR QUE TINHA
ESCOLHIDO PASSAR POR TUDO ISSO?”
Eu estava prestes a matar aquele homem. Claro que eu sabia das más
intenções que ele nutria em relação à Patrícia. Ela era minha noiva e eu não
podia admitir que ele ficasse perseguindo minha noiva, mas como não adiantava
conversa, eu fui armado. Porém, naquele mesmo dia, quem poderia imaginar um
bêbado dirigindo?
Era tão cedo, profundamente alcoolizado, ele bateu no meu carro com
tanta força que me atirou para fora da pista. Eu fiquei preso entre as
ferragens e após muitas horas de tortura, tive a notícia que não tinha o que
fazer, eu teria uma perna amputada. Estranho como tudo muda na nossa cabeça. As
prioridades de preocupação mudam. Eu estava preocupado com o homem que
perseguia minha noiva e, horas depois, estava preocupado com minha saúde, com
minha perna. Eu só pensava em andar novamente, ser normal, inteiro.
Depois do ocorrido, minha mente se perdeu de mim. A Patrícia entrou no
quarto e viu um farrapo de homem. Ela tentou ficar comigo, mas eu já não era o
mesmo. Eu me senti diminuído, senti que não podia mais fazer nada, perdi minhas
perspectivas de futuro. Patrícia foi embora e nunca mais quis saber de mim.
Qual é a mulher que quer um inválido?
Eu pensei que nunca iria me relacionar com outra mulher. Mas, nós somos
muito fatalistas doutor. Fico pensando que, se eu soubesse do futuro, nem tinha
me torturado tanto.
Acho que a mente impulsiona a gente e o ser humano tem muito potencial.
A gente pode quase tudo neste mundo. O tempo passou e depois da minha revolta
inicial, eu tive que voltar para casa. Tive que conviver com as pessoas e
precisei ser menos hostil para estar cercado delas.
Eu respirava fundo e quando não aguentava mais, voltava para casa, mas
procurei não me esconder do mundo, viver em sociedade é importante para a gente
crescer.
Quando é que eu ia imaginar que tinha escolhido passar por tudo isso?
Sobrevivi, trabalhei com muletas, depois fui me virando e arrumei uma namorada
que foi formidável, se tornou minha esposa e me deu uma família incrível. Minha
vida foi muito melhor do que eu poderia imaginar. Cheia de alegrias e exemplos
edificantes. Hoje eu estou aqui e percebo que tudo foi válido. Ainda estou com
dificuldade para assimilar as passadas com a perna que já conseguimos imantar.
Não pensei que fosse assim... Coisa linda ver a perna voltar, ver o meu corpo
voltar ao normal foi fantástico. As sensações demoraram um pouco mais e, por
isso, está sendo complicado entender como movo esta nova perna, depois de
sessenta anos sem ela. Vivi muito e só posso agradecer por tudo o que estão
fazendo por mim.
AGNALDO
14/09/19
----------------------------------------Paula Alves--------------------------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“NINGUÉM DEVE RENUNCIAR A VIDA DE PAZ E DECÊNCIA”
Eu cresci na favela. Estranho pensar que a gente não tem muita escolha.
O sistema cria pessoas revoltadas, pessoas sem perspectiva que vivem num mundo
onde tudo é sombrio. A gente só tem acesso a violência, ao medo e a revolta
mesmo, mais nada. A criançada faz de conta que vai ser gente na vida. Brincam
de jogar futebol na inocência, achando que um dia vão se tornar um Neymar, um
Ronaldo. Que jeito? Eles morrem antes de completar quinze anos, cara!
Eu fui crescendo, vendo minha mãe se matar de trabalhar para comprar o
básico para dentro de casa, enquanto, minhas irmãs tinham filhos e se envolviam
com homens parecidos com nosso pai. A discriminação estava estampada no rosto
de todos. Quando a gente sai da favela, o mundo denuncia que não quer a gente
por perto. Não precisa andar muito para ser apontado. Parece que está escrito
na sua testa: sem educação, pobre, morto de fome.
Eu tive vergonha de muita coisa e é daí que nasce a revolta. Revolta
daquela casa que não tinha um teto decente, revolta da minha mãe que escolheu
um crápula como meu pai que escolheu ir embora, abandonar a mãe cheia de
filhos, revolta por ver tanto pobre que esmola e usa droga. Eu fui um típico
revoltado e, um dia, parei ali na Praça da Sé, foi um dia ruim porque eu estava
procurando emprego. Eu tinha sonhos como todo jovem e esperava mudar minha
situação, ajudar minha mãe, ser diferente. Mas, eu fui apenas mais um moleque
que recebe uma porta na cara. Eu tinha tanta esperança, eu estudava, mas o cara
da empresa me mediu, perguntou onde eu morava e, assim a entrevista acabou,
favela...
Eu sentei num muro qualquer porque eu não queria chegar em casa com cara
de choro, sim eu chorei. Eu chorei de revolta, de vergonha e porque senti
humilhação. Eu fiquei desmotivado, frustrado. Achei que seria sempre desta
forma ou talvez, ainda pior, por isso chorei. Veio um senhor ao meu encontro e
simpatizei com ele. Conversamos muito e ele me disse que cada um tem o direito
de escolher ser o que quiser. Nós podemos ser fracassados, preguiçosos,
acomodados ou podemos escolher a coragem, renunciar tudo o que for de ruim e
buscar a vitória, a partir de nossos esforços. Cada um de nós pode conquistar
um mundo melhor se fizermos por onde. Ele me incentivou a continuar estudando e
não aceitar a humilhação. Ele disse que muitas coisas partem da nossa postura,
da forma como abraçamos o mundo, da forma como acreditamos ser. Quem vê apenas
a pobreza, a humilhação e se revolta o tempo todo, se joga no chão, na
marginalidade, na delinquência e aceita, apenas o que for migalha. Eu não
queria esta vida de miséria para sempre. Eu agradeci aquele homem e quando ele
partiu, eu acordei.
Me espantei porque não percebi que havia me recostado no muro e
adormecido como um morador de rua. Que horror! Não era minha intenção adormecer
ali, mas eu havia sonhado com tudo aquilo, aquele papo cabeça que me fez
acreditar em mim mesmo e em todas as minhas expectativas de alcançar uma
posição melhor para mim e minha família.
Voltei para casa e senti que ali não era meu lugar, mas eu me preocupava
com minha mãe e irmãs, porém eu precisava partir, sentia que em outra parte
poderia me reestruturar para o bem de todos. Fui embora, segui a intuição e
procurei serviço numa cidade perto de onde estávamos. Logo, consegui me
organizar com emprego e moradia, fiquei tão feliz. Quando estava bem, voltei
para a favela e convidei para que todos fossem morar comigo, elas sorriram
felizes e partimos.
Era uma casa muito pequena, sem conforto, mas havia a esperança de uma
vida melhor. Orientei minhas irmãs que arrumaram empregos simples, mas isso,
forneceu um dinheiro a mais. Mamãe pode se ocupar, apenas da casa e das
crianças que estavam estudando perto dali. O fato é que deu tudo certo. Não
houve facilidades, mas também não houve vício, nem leviandade. Nós trabalhamos
muito, mas encontramos novas oportunidades, pessoas bondosas que se tornaram
parte da família. Aos poucos, estávamos todos casados, mamãe sempre conosco
sendo bem tratada na medida do nosso possível. Todos unidos e confiantes.
Ninguém deve renunciar a vida de paz e decência.
MILTON
08/09/19
----------------------Paula Alves----------------------------
“O MATERIALISMO CORRÓI OS BONS
SENTIMENTOS”
São interesses escusos. Cada pessoa sabe no íntimo o que lhe move.
Algumas permitem que vícios morais lhe conduzam. Enraizados no orgulho, na
vaidade fazem tudo para serem vistos, deixando propósitos edificantes de lado.
Eu creio que Elisa, nem se quer, percebeu o quanto ela me afetou com sua
atitude mesquinha. Fomos tão amigas, eu a via como uma irmã. Adorava sua
companhia e confidenciava toda minha vida para ela. Nós estudamos juntas e
sempre foi um sonho termos uma escolinha. Fizemos tudo para conquistar este
sonho. Eu sempre adorei crianças. Acho que para ficar com elas, desempenhando
qualquer atitude que seja, as pessoas devem amá-las. Devem contar com a maior
paciência e dedicação. Considero, neste momento, que somos Espíritos eternos e
todos nós, independente da idade, temos conhecimentos adquiridos há muitas
existências, por isso, é mesmo impossível prever quem sabe mais. Nada de
autoritarismo. Eu sempre acreditei no amor, na humildade. Estive com crianças
porque adoro este contato, mas minha amiga não tinha a mesma devoção. Elisa
tinha interesses materiais que extravasavam qualquer cota de sentimentalismo.
O materialismo corrói os bons sentimentos. Existem materialistas
disfarçados de tudo por aí. Disfarçam-se de religiosos, filósofos e democratas.
Materialistas se entregam por qualquer coisa, não veem senão o aqui e o agora,
enxergam apenas seu umbigo, o seu modo de raciocinar. São pessoas que
naturalmente proferem monólogos cansativos onde só elas têm a razão. Eu me
deixei envolver por razões sentimentais, enxerguei minha amiga como eu, mas
fomos muito diferentes. Conseguimos a escolinha. Enquanto eu me propunha a
dedicar horas aos cuidados com as crianças, ela preferia a parte burocrática e
quando percebi estava me tirando da sociedade.
Nós confiamos em quem?
Sabemos em quem podemos confiar?
Você confidencializa pensamentos secretos achando que a pessoa é sua
amiga e ela estava me envolvendo em chantagens e negociações. Eu preferi sair
de forma amigável, senti o distanciamento dos meus aluninhos, chorei muito.
Achei que entraria em depressão, mas senti no fundo do meu ser que Deus estava
comigo. Aos poucos, fui renovando os sonhos e parti sozinha para realizá-los.
Casei, tive filhos, consegui um local onde pude lecionar para os pequeninos.
Tive muitas felicidades, mas nunca me esqueci da Elisa. Eu sofri muito a
decepção. Soube, chegando aqui, que nossos planos foram traçados na
espiritualidade. Cuidar de crianças é missão. Missão gloriosa que deve ser
observada com extrema atenção. Fracassamos, ela escolheu mudar de lado, por
isso, teremos nova chance para realizar esta tarefa. Eu desejo tirar todo
sentimento de decepção de dentro de mim, para que isso não nos atrapalhe. Eu
preciso perdoar.
CÁSSIA
08/09/19
---------------------------------Paula
Alves--------------------------
“NEM SEMPRE TEMOS DA
VIDA O QUE QUEREMOS TER, MAS, MESMO ASSIM, É O MELHOR QUE PODERÍAMOS TER
RECEBIDO”
A responsabilidade começou muito cedo. Eu engravidei a Larissa quando
tínhamos quinze anos. Nossos pais conversaram e resolveram que nos apoiariam
para o bem de todos, principalmente da criança que geramos. Eu estava
assustado. Não imaginei que um momento podia mudar toda minha vida. Eu gostava
da Larissa, mas não tinha pensado se queria passar o resto da minha vida com
ela. Não tinha o que dizer. Eles solucionaram nossos problemas e foram para
suas casas. Agora éramos um casal de verdade, na espera do nosso filho que nasceria
a qualquer momento. Meu pai me arrumou um emprego porque eu, agora, era o homem
da casa. Larissa passava mal, era manhosa, eu fazia tudo para que ela estivesse
bem, a pedido das nossas mães. Mas, tudo aquilo estava me cansando. Eu via meus
amigos indo para as festas e eu tinha que ir trabalhar. Enquanto, todos iam
viajar, eu tinha que cuidar da minha família. Quando o bebê nasceu foi ainda
pior porque a criança não dormia, nem eu. Sei que minha vida foi um turbilhão
de momentos difíceis. Eu permiti que as pessoas ditassem o que eu devia fazer e
fui vivendo.
Depois de dez anos, olhei para Larissa que já estava profundamente
modificada e percebi que arruinei minha vida. Ela se tornou autoritária e
ofensiva. Desejava isso e aquilo, dizia verdades em qualquer local me
constrangendo. Eu não estava mais aguentando, comecei a adoecer. Problemas de
estômago, gripes recorrentes, vontade de me jogar na cama. Comecei a beber para
ver se sentia alguma coisa diferente do que submissão e pesar. Eu gostava dos
meus filhos, eu gostava da minha família, mas parecia que não era feliz, não
tinha ânimo. A bebida me provocou um sentimento novo, de incapacidade. Voltei
para casa embriagado e falei coisas que não podiam ser ditas e minha esposa
ficou chocada. Ficamos uma semana sem olhar nos olhos, constrangidos.
Depois, conversamos e percebemos que não tínhamos nada em comum, mas
nosso filho havia nos unido. Eu não queria estar com ela, mas precisava estar
com ela porque nós fizemos esta escolha quando tivemos um filho. Naquele
momento, mudamos tudo e precisávamos ter fôlego para superar e seguir em
frente. Todos diziam para separar. Falavam que ela me prejudicava, mas eu
percebi que aquela era minha família. Eu não tinha outro lugar para ir, apenas
a minha casa com a Larissa.
Eu tentei, ela tentou e começamos a olhar diferente, buscar novas
situações e notei uma mulher diferente. Para ela também não foi fácil, mas
esteve sempre comigo. Ela confessou que me punia, de certa forma, pelas
frustrações dela. Observamos nosso filho, já homem feito e nos abraçamos com
gratidão porque ele era uma pessoa boa demais. É isso. Nem sempre temos da vida
o que queremos ter, mas, mesmo assim, é o melhor que poderíamos ter recebido.
Devemos olhar com gratidão tudo o que recebemos dela e nos esforçarmos para não
decepcionar ninguém, nem nos arrependermos do que sempre esteve conosco e, por
dúvida do que poderia ter sido, deixarmos tudo escapar pelas mãos.
IGNÁCIO
08/09/19
------------------------Paula Alves----------------------
“AS PESSOAS DEVEM SABER SE VALORIZAR”
Se eu quisesse teria me esquecido de todos os princípios e teria me
entregado à vida fácil. Parece que algumas oportunidades aparecem para testar
sua fé, sua coragem e sua índole. Eu trabalhei numa casa de massagem. Lá tinha
moças de todos os tipos, mas uma constante era a beleza. Muitos homens faziam
convites e pagavam muito bem para as moças que aceitavam sair com eles. Para
fazer mais do que uma simples massagem.
Eu não tinha interesse de sair com ninguém. Aceitei o emprego depois que
meu esposo morreu. Eu tinha uma criança pequena e precisava trabalhar, então,
não escolhi muito, me preocupei com o salário, mas meu patrão disse que não era
para fazer programa, as moças saíam com os clientes se quisessem sair.
Estava indo bem, minhas colegas me respeitavam porque todos sabiam da
minha história triste, a viuvez tinha me tornado uma mulher abatida. Mas,
encontrei um homem. Um cliente que me propôs uma saída, apenas uma, eu recusei
como fizera todas as vezes, mas ele era insistente. Isso o motivou a aparecer
toda semana, queria estar sempre comigo. Ele me respeitou, conversamos e nunca
aconteceu nada. Depois de algum tempo, eu consegui outro emprego e saí de lá.
Anos se passaram até que, um dia, reencontrei aquele cliente que foi
muito gentil e me chamou para um passeio, eu gostei dele e resolvi aceitar, mas
eu me arrependi amargamente. Ele apresentou um jeito estranho. Me observava
diferente, falou que não costumava ser desprezado. Disse que não me esqueceu,
me procurou muito, depois que eu fui embora. Eu fiquei com medo dele, desejei
ir embora, ele tentou me agarrar, mas Deus ouviu minhas preces e um senhor
percebeu meu temor, se ofereceu para me defender e eu fui embora. Isso fez com
que eu nunca mais me envolvesse com ninguém.
Até que ponto podemos confiar nas pessoas?
Eu tive um casamento bom com um homem carinhoso e delicado que me deu um
filho lindo, mas a vida quis que ele desencarnasse tão cedo me obrigando a
trabalhar para sustentar a casa. Eu quase passei por uma situação que poderia
ter me custado a vida. Não tenho do que me queixar. Qualquer mulher pode passar
por isso.
Atualmente são tantas que sofrem. Sofrem caladas com medo das surras,
das humilhações. Medo de tudo. Medo do abandono, dos maus tratos, da
intolerância e até mesmo da discriminação da sociedade.
O que é o amor?
Homens que desejam ter. Ter um corpo, ter o controle sobre a pessoa.
Chamar de “sua”.
Eu pensei tanto sobre isso que achei melhor fazer alguma coisa, mas o
quê? Deus foi colocando no meu convívio pessoas que tiveram experiências muito
piores do que as minhas e formamos um grupo de reajuste. No início nos reunimos
sempre na casa de uma de nós para conversarmos, depois colamos panfletos, fomos
nas escolas e todos os lugares onde havia muitas mulheres incluindo casas de
prostituição para falarmos sobre respeito, direitos, amor próprio, lei. As
pessoas devem saber se valorizar. Não permitir nem mesmo um olhar de agressão.
E, se para ficar com o outro, eu preciso abandonar minha dignidade, então,
minha amiga, é melhor ficar só. Grata.
CREUZA
08/09/19
-----------------------------Paula Alves----------------------------------------
Foto cedida por Magno Herrera Fotografias
“NÃO TEM COMO MODIFICAR
O CORPO SEM MODIFICAR A ALMA”
Eu tenho me perguntado o porquê de tamanha
vaidade. Eu sempre quis ser a mais bela. Quando criança eu tive tantos
defeitos. Pelo menos, era isso o que todos diziam. Uns falavam do meu cabelo,
outros do meu nariz. A verdade é que eu não era bela. Cresci sendo motivo de
chacota. Meus familiares diziam para os meus pais que eu era diferente das
minhas irmãs, elas eram tão bonitinhas...
Mas, eu não. Depois, na escola foi muito pior
porque as meninas riam, debochavam e, mais velha, eu nunca consegui arrumar um
namorado, chorei, sofri. Mas, quando me tornei adulta, comecei a trabalhar,
ganhei meu próprio dinheiro e pude ir em busca do meu ideal de beleza. Meu
sonho era ser bela. Então, fiz tudo o diziam ser fórmula de beleza. Para os
cabelos todos os alisantes que conheciam, eu sempre me alimentei com moderação
para não engordar e tinha uma loucura pela cirurgia plástica.
Eu precisava modificar meu nariz. Só assim,
seria realmente feliz e realizada. Foram tantos planos, tantos anseios. Eu não
vi nada do que era realmente importante. Em meu caminho passaram pessoas
incríveis e eu estava tão envolvida com meus ideais de beleza que deixei as
oportunidades passarem. Conheci um homem maravilhoso que me dizia o quanto ser
diferente é imprescindível para que possamos nos respeitar. Ele falava o quanto
eu era bela para os seus olhos e eu nunca acreditei. Ele se cansou de mim, por
fim, me chamou de fútil. Ele queria se casar, ter filhos, mas eu tinha um
objetivo. Não estava pensando em nada que pudesse piorar minha situação.
Imagina uma gravidez... Isso me traria mais problemas. Eu não queria estragar o
meu corpo, queria operar meu nariz.
Eu consegui operar, mas foi aí que meu mundo
caiu aos pedaços. Eu achei que fosse castigo de Deus porque eu coloquei tudo em
segundo plano e o que aconteceu quando eu olhei no espelho? Eu havia me tornado
um monstro.
O nariz agora estava deformado. Nunca imaginei que
ficaria ainda pior. Eu me senti ultrajada e humilhada quando o médico
simplesmente disse que alguma coisa saiu errado. Eu gritei, esbravejei, falei
que processaria e, realmente processei, mas nada modificou minha revolta. Nunca
mais voltei a ser o que era. Eu precisei ficar com este aspecto.
A verdade é que, depois de tudo, veio a
revolta, mas os anos passaram e tive tempo para pensar. Tive tempo para admitir
que o erro foi inteiramente meu porque eu não devia mexer na estrutura saudável
que eu recebi. Eu queria tornar perfeito o meu rosto, mas ele já tinha a
perfeição que eu poderia assumir. Os campos mentais têm que permitir uma
mudança real. Não tem como modificar o corpo sem modificar a alma.
Eu entendi que eu só podia ter um nariz com
falhas porque meus pensamentos nunca foram harmoniosos. Eu sempre fui
egocêntrica. O mundo sempre girou em torno de mim. Foi horrível quando percebi
que eu merecia tudo aquilo, eu sempre mereci. Compreendi que deixei tudo para
valorizar o que há de menor significância, a aparência.
Estou aqui, ainda com este nariz que me
lembra a todo instante que tenho que ampliar minha visão. Tenho que sair do meu
mundo e tentar ser útil para o todo porque faço parte do todo. Nem sei quando
e, se será possível, modificar esta aparência. Hoje acho que é melhor continuar
assim, me sinto envergonhada.
TAÍS
04/09/19
-------------------------Paula
Alves----------------------
“NÃO É O QUE ENTRA PELA
BOCA QUE FERE O HOMEM, MAS O QUE SAI DELA”
Ela não me deixava comer. Minha mãe era
linda! Tinha todos os atributos da beleza. Todos sorriam para ela. Era como se
as portas se abrissem para ela passar. Eu notava que ela era o centro das
atenções e ela também sabia disso porque sempre comentava que a beleza é
fundamental sim! Minha mãe se aproveitou da beleza para conseguir o que queria.
Era sempre sedutora com meu pai, mas com as outras pessoas de nosso convívio
social também, muito sedutora. Ela foi me ensinando e dizia que ela tinha sorte
de ter uma genética que lhe permitia se alimentar sem se preocupar com
sobrepeso, mas eu havia puxado a família do meu pai, então, tinha que tomar
cuidado.
Eu ouvi isso a vida toda. Ela fazia o meu
prato e ai de mim se eu quisesse mais um pouquinho, ela me fazia lembrar das
minhas colegas gordinhas e comentava o quanto o mundo podia ser cruel com
pessoas feias e desajeitadas. Eu morria de vontade de comer um lanche, comer
com a mão, comer um enorme sorvete ou um grande pedaço de bolo com cobertura e
ela só me olhava com contrariedade, eu já sabia que era proibido. Levei uma
surra horrível quando fomos à festinha de uma amiga da escola e ela me viu
pegar uns doces, estavam ótimos, mas minha mãe fez se tornarem amargos como
fel.
Deu desgosto olhar para comida com o passar
dos anos. Eu morria de vontade. Ela cuidava de tudo. Dizia que eu devia ter uma
boa aparência para arrumar um bom marido. Foi mexendo tanto com a minha cabeça
que ficou fácil rejeitar os alimentos. A educação força tanto a mudança de
hábitos que, de repente, tudo vira movimento automático. Cuidar das curvas, se
preocupar com a numeração das roupas, de uma hora para outra, deixaram de ser
preocupação, eu me condicionei, me tornei uma Barbie.
Mamãe conseguiu fazer de mim uma cópia dela.
Eu fiquei linda, corpo perfeito, simetricamente escultural, pele, cabelos,
impecável! Eu sorria para todos e me alimentava, apenas do que era indicado
para meu biotipo. Não podia aumentar meu manequim. Certamente, tive muitos
pretendentes. Deixei minha mãe escolher o que seria o melhor partido para mim e
não notei que eu não tinha ideais. Sempre fui castrada, menosprezada nos meus
interesses. Permitir que ela tomasse conta de minha vida me fez como uma
marionete para ela.
Apenas, muitos anos depois, quando ouvi uns
desaforos de uma vizinha foi que a verdade chegou até mim. Ela me ofendeu, mas
no fundo eu precisava ouvir tudo aquilo. Todas as ofensas mexeram comigo e eu
me precipitei a esmorecer porque considerei que eram verdades absolutas. Ela
estava certa com minha falsidade, leviandade. Eu era fria e calculista. Naquela
noite, me entreguei a um pote de sorvete, meu marido se admirou muito e me
acompanhou, nós dois rimos de tudo e foi como se eu tivesse cortado as amarras
que mamãe colocou na minha infância. Eu ainda tenho muitas situações para
limpar da mente. Muita coisa que cresci acreditando sendo o ideal para todas as
pessoas e que, na verdade, não servem para nada. Não é o que entra pela boca
que fere o homem, mas o que sai dela.
JORDANA
04/09/19
--------------------------Paula Alves---------------
“BELOS TODOS NÓS SOMOS
QUANDO CONSERVAMOS BONS SENTIMENTOS, BOAS VIRTUDES, QUANDO FAZEMOS O BEM”
Eu precisava mudar aquela situação. Fui gorda
a vida toda e não queria passar o resto da minha vida sendo insultada por causa
do meu corpo. Eu queria colocar um biquini sem me preocupar se estava sendo
apontada. Eu adorava comer, mas nos últimos anos não podia comer quase nada.
Tinha que controlar tudo porque estava engordando cada vez mais. As pessoas são
impiedosas. Falam bobagens sem se preocuparem se estão ofendendo. Eu não
aguentava mais isso. Precisava me libertar da balança, dos vegetais e dos
insultos, então, me comprometi com um tratamento médico que se iniciava com
medicamentos. No início, não senti muita mudança, mas depois comecei a notar
que estava emagrecendo um pouco. O problema é que a medicação tinha efeitos que
me deixavam um pouco confusa, sonolenta, mas se era para uma boa causa eu
continuei tomando, até que um dia, retornando para casa quase causei um
acidente por causa da sonolência. Conversei com o médico, ele mudou o remédio,
desta vez, senti enjoo, tive vômitos, conversei novamente com o médico que
disse que isso era ótimo porque assim perderia peso muito mais rápido.
Eu aceitei, até que ele percebeu que eu já
havia perdido vinte quilos e ainda faltava muito para alcançar o peso ideal.
Ele me propôs o ato cirúrgico para eliminar as camadas de gordura que ainda me
faziam ser gorda. Eu nem pensei. Avisei minha família que depois da cirurgia
tudo seria diferente. Eu estava feliz, estava iludida com tudo o que aquele
tratamento poderia fazer para mudar minha vida. Eu confiei no médico, paguei a
quantia exorbitante que ele me cobrou e me entreguei aos seus cuidados. Quando
acordei, ainda estava com os cortes abertos. Não vem ao caso, mencionar a
angústia que senti, a dor, a frustração e o desespero que tomaram conta de mim
porque eu ainda estava na mesa de cirurgia, sozinha e meu corpo estava aberto.
Eu pedi socorro, gritei. Não sei precisar quanto tempo fiquei ali. Não sei
dizer quanto tempo levei para compreender que a cirurgia deu errado e eu morri
ali mesmo, enquanto tentava ficar magra e perfeita.
Depois do sofrimento, pessoas amáveis vieram
até mim, cuidaram de mim como se fossem médicos do plano carnal e me trouxeram
para cá. Estou melhor, ainda tenho a sensação de dormência no local da incisão,
inchaço, dor. Hoje, eu compreendo que deveria ter aceito meu corpo como um
corpo perfeito. Deveria ter me alimentado com moderação porque isso é essencial
para um corpo saudável. A busca deve ser pela saúde e bem-estar e não pela
beleza. Belos todos nós somos quando conservamos bons sentimentos, boas
virtudes, quando fazemos o bem. Mas, eu não sabia disso. São muitos preconceitos.
Eu fui a maior preconceituosa de todos porque
eu nunca me aceitei como realmente fui, sou! Agora estou aqui, tentando
entender o que eu deveria ter feito e não fiz. O plano, não passei nem perto de
concretizar porque me detive com questões banais da vaidade. Falta muito para
me tornar uma pessoa melhor. Sou grata.
JULIANA
04/09/19
------------------------Paula Alves----------------------
“É IMPORTANTE AQUILO QUE
A GENTE DESPERTA NA SOCIEDADE E TODO O BEM QUE A GENTE PODE FAZER”
Eu não sei o que vi nele. Não era bonito ou
sedutor, charmoso de jeito nenhum, mas era bem humorado, inteligente,
espirituoso. Conheci o Levi quando me separei do meu primeiro marido - o
Gerônimo. Este sim era bonito, musculoso e sem vergonha, me traiu com a rua
inteira.
Aí chegou o Levi. Ele me fazia rir, gostava
muito de falar com ele, mas não podia sair com ele para não ser mal falada. O
que minha família ia dizer? O Levi era até vesgo, coitado! Eu temi virar
chacota. Não bastava ter chifre, ainda ia ter que ser chacota por causa do
Levi? Então, eu falava que não queria sair com ele, mas a gente se falava muito
por telefone e a nossa amizade foi ficando grande, forte.
O Levi estava sempre me apoiando em tudo, ele
me impulsionava. Me falou tanto de sonhos que me fez ter sonhos para sonhar. Eu
quis voltar a estudar, quis dirigir, eu quis trabalhar e consegui um emprego
bom para cuidar do meu filho com o Gerônimo. Levi foi quem me deu apoio no dia
da morte do meu pai. Sempre por telefone, a gente não saia, mas era como se ele
estivesse sempre comigo e a conversa foi ficando cada vez mais firme, mais
pessoal. Era uma amizade tão bacana que quando eu percebi estava sentindo a
falta dele. Daí a minha cabeça foi mudando. Combinei de ir ao cinema, depois de
anos, olhei para ele e foi como se os defeitos se transformassem em qualidades.
Ele me pareceu um homem mais alto, mais forte, uma voz mais bonita e o olhar
lindo, penetrante. Sei lá.
É possível isso doutor?
A pessoa era feia e ficou bonita? Coisa de
outro mundo né?!
Olhei para ele e não vi motivos para não
amar. Ele era tudo para mim. Fiquei confusa. Por que eu havia perdido tanto
tempo? Nem deixei passar daquele dia, não me importei com o que ele iria
pensar. Eu me declarei e dei um beijo que me tirou do chão. Eu não sabia, mas
estava reencontrando um amor de longa data.
Nossa união foi um presente de Deus. Passei o resto dos
meus dias com o Levi, agradecendo a Deus pela vida que eu tive porque foi muito
bom. Fizemos família, ele sempre gostou do meu filho com o Gerônimo. Eu percebi
que o que vale em nós são nossos pensamentos, nossas palavras e nossas ações. O
importante é tudo o que a gente faz as pessoas sentirem. É importante aquilo
que a gente desperta na sociedade e todo o bem que a gente pode fazer. As
rugas, as gordurinhas, os detalhes do seu rosto isso nem é importante. As
pessoas podem até pré-julgar você pelo seu corpo, por sua aparência, mas quando
a gente abra a boca tudo pode mudar porque a boca diz o que está cheio o
coração.
A gente é o que é. Eu descobri que a gente se
camufla doutor. O bonito volta como feio, o feio vira bonito. O branco volta
negro, o elegante volta desdentado. Tem rico que andava num carrão que volta na
cadeira de rodas e, assim todo mundo aprende o que tiver de ser importante para
abrandar seu coraçãozinho. O ideal é perceber isso rápido para não sofrer muito
e nem perder tempo de ação porque de verdade, aí é tudo ilusão.
SEBASTIANA
04/09/19
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